domingo, 15 de novembro de 2009

Erundina não pode se comparar a Paulo Maluf



Luiza Erundina e Paulo Freire

Não é possível que políticos que comungam das ideias da ex-prefeita Luiza Erundina ou mesmo aqueles que com ela mantêm uma relação de respeito e afeto não se mobilizem para conseguir os recursos necessários para evitar a execração política e pessoal dessa grande mulher!

Há de se perguntar se "a condenação por processo político", como diz o articulista Paulo Moreira Leite, suplanta a condenação por crimes comuns executados em plena atividade pública por muitos senadores, deputados, governadores, prefeitos e vereadores. Com a palavra o sistema judiciário tupiniquim.

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Estou escandalizado duas vezes. Primeiro, diante do processo contra a prefeita Luiza Erundina, que pode perder a casa, os dois automóveis e todo seu honrado patrimonio político para indenizar a prefeitura de São Paulo. Segundo, com os argumentos lançados em defesa de Erundina.

Erundina está sendo condenada por um processo político. Em 1989, como prefeita da maior cidade do país, ela publicou um anúncio nos jornais afirmando seu apoio a uma greve no setor de transportes. Pagou o anúncio com o dinheiro da prefeitura. Vinte anos depois, o caso chegou à instância final da Justiça e a ex-prefeita terá de indenizar os cofres públicos.

Ninguém imagina que ela tenha embolsado um centavo daquele dinheiro. Ninguém questiona o motivo de seu ato: ela publicou aquele anuncio porque achava que era sua obrigação política, como cidadã e como prefeita de São Paulo.

Num esforço para defendê-la, seus aliados lembram casos de corrupção e impunidade e perguntam: e Paulo Maluf? E Celso Pitta? A intenção é boa mas o saldo final é um absurdo. As denuncias contra Maluf e Celso Pitta envolvem um tipo de delito que se pode definir como crime comum. Sua finalidade era o enriquecimento, o benefício pessoal. Não tem relação com a denúncia contra Erundina. Aquele anuncio de 1989 foi um gesto político e não há razão para qualquer menção à impunidade de Maluf e Pitta.

Em 1984, diversos governadores de Estado e prefeitos liberaram o transporte coletivo, inclusive ônibus e metrô, para favorecer os comícios pelas eleições diretas. Em 1992, durante o impeachment de Collor, fez-se a mesma coisa. Imagine se essas autoridades tivessem sido forçadas a devolver o dinheiro que deixou de ser arrecadado.

O tratamento a Erudina reflete o ambiente de despolitização da nossa vida pública. Não há debate de idéias nem de projetos para o país. As visões de mundo não importam. A honra deixa de fazer sentido. Em consequencia, tudo se nivela por baixo.

Você pode discordar das idéias de Erundina — hoje, ontem e sempre. É muito provável que, duas décadas depois, nem ela seja favorável a uma greve no setor de transportes.

Mas é difícil negar seu comportamento exemplar, de quem permaneceu fiel a princípios e convicções.

Ela não merece um processo. Merece aplauso. Vários políticos constroem um patrimonio em sua vida pública. Luiza Erundina construiu uma biografia. Esta é a grande arma de sua defesa — e é por isso que merece apoio. (ÉPOCA)


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