(BR Press) – Uma das coisas que sempre tornavam o trabalho mais divertido no interior eram os vocábulos. Nada do estresse gratuito ou da neurose idiopática das grandes cidades. Nada disso.
A rotina consistia em saber o nome do vizinho, comer um bolo de chocolate na praça aos domingos e chegar no posto de saúde bem cedo, no frio da manhã de segunda-feira, para descobrir um bule de café cheiroso recém-passado brotando da copa.
- Pois não, seu Josemar, o que está havendo com o senhor hoje?
- Ah, doutor, eu tô tomando direitim os remédio da pressão. – Pega a sacola de plástico surrada e bem atada com um nó caprichoso e dela vai tirando e colocando sobre a mesa uma coleção de cartelas amassadas.
- Esse pequeninim aqui ó, o Aécio (AAS, anticoagulante), esse outro Lazico (Lasix, um diurético) e o Colorama (Clorana, outro diurético) pra módi forçar a urina, mas vou falar pro sinhô, num ando me sentino muito bem não.
Sigo o exame enquanto ele desenvolve a história. Pressão ok, ausculta cardíaca ok, mas pulso com frequência levemente aumentada. Pulmões jóia. Bem hidratado, talvez um pouco pálido.
- Hum.
- O pobrema é que já tem uns dias que ando sem apetite e obrando (evacuando) escuro. Acho que a ursa tá atacada.
- Como?
- A ursa, médico.
- ?
E ele aponta para a boca do estômago.
- A ursa.
- Ah…. a úlcera!
A endoscopia mostrou realmente uma ursa atacada. Mordida, até. Uma ulceração havia se formado no começo do duodeno. Provavelmente, desencadeada pelo Aécio. Não o político mineiro, mas o comprimidinho amarelo.
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