sexta-feira, 14 de maio de 2010

O PODER CIVILIZADO

Por Inácio Strieder*

Em todos os livros escolares de história universal, há um capítulo sobre Alexandre Magno, ou Alexandre, o Grande (356-323 a.C.). Alexandre é conhecido pelo vasto império que conquistou. Foi, por assim dizer, o primeiro movimento de globalização da política e da cultura no mundo ocidental. Seu império ia dos Bálcãs à Índia, do Egito ao Afeganistão. Promoveu o intercâmbio étnico e cultural, privilegiando a cultura grega. Muitos, até hoje, se perguntam como este jovem macedônio, filho do Rei Filipe da Macedônia, educado pelo filósofo Aristóteles, conseguiu conquistar e organizar um tão vasto império. Claro, esse império foi efêmero, pois se desmembrou com a morte de Alexandre.

Mas a política de Alexandre Magno teve consequências perenes para o futuro da civilização ocidental. Por isto, ainda hoje, é interessante pesquisar o método político de Alexandre para formar seu império. Evidentemente, em primeiro lugar, Alexandre deve o sucesso ao seu destemido exército; depois à sua tática de respeitar os costumes e as religiões dos povos conquistados. Mas não foi só pela violência das armas e pela tolerância que Alexandre Magno conquistava os povos. Alexandre também era exímio em corromper o mundo político que queria dominar. Já aprendera de seu pai, o rei Filipe, que aos governantes dos povos são corruptíveis economicamente. E isto Alexandre, inúmeras vezes, pôs em prática, pois achava que era muito mais vantajoso transpor os portões e os muros de uma cidade pela corrupção de seus governantes do que pela violência das armas. E deixou para a história a experiência de que "nenhum muro de cidade resiste, ou nenhum portão de cidade permanece fechado, diante de um burro carregado de ouro".

Hoje diríamos, se atendermos à filosofia de Alexandre Magno, que nenhum governante (político!) resiste a um mensalão, a uma propina. E, curiosamente, nós constatamos que esta é uma verdade em diversos ambientes de nossa política. Não podemos afirmar que a máxima de Alexandre valha para todos os tempos, para todas as culturas, nem para a maioria dos políticos. Pois a política, na medida em que ela se civiliza, se humaniza, se democratiza e se justifica no mundo evita que o poder se corrompa. Embora continue válida a outra afirmação de que "o poder corrompe, e o poder absoluto (tirânico) corrompe absolutamente". O poder civilizado já não se afirma mais nem pela violência das guerras, nem pela corrupção, mas se impõe pelas ideias. A Revolução Francesa, com desconto de seus desvios, foi impulsionada pelas ideias de liberdade, igualdade e fraternidade. A superação da escravidão foi motivada pelas ideias de liberdade e igualdade; outros movimentos se apoiam na justiça. Desta forma, os políticos que hoje buscam e afirmam seu poder, recorrendo ao "burro carregado de ouro", de Alexandre Magno, praticam uma política com milênios de atraso. É de ter pena de quem os elege, de quem os sustenta no poder e a eles se submete. Deve-se pensar nisto nas próximas eleições, e examinar quais as ideias, os pojetos e as práticas de nossos políticos, deixando de admirar aqueles que chegam ao poder através de "burros" carregados de corrupção. O poder civilizado se afirma por ideias, projetos e seviços, mostrando transparência em tudo que faz. É o exercício deste poder que dignifica a prática política e os seus mandatários. O resto é atraso.

* Doutor em Teologia pela Münster Universität, Alemanha. (1975), Professor do Departamento de Filosofia da UFPE. Áreas de atuação e orientação: Antropologia Filosófica, Religião e Sociedade, Ética.

Fonte: Jornal do Commercio, Caderno Opinião, 14/05/2010

Um comentário:

zcarlos disse...

Ótimo texto cumpadi, parabéns.
Abs.

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