sábado, 6 de novembro de 2010

Os efeitos colaterais de uma campanha suja

Por LEN*

Diga-me com quem andas...
A vovó sempre dizia que se colhe o que se planta, e a vovó é que sabia das coisas. Infelizmente, o país não poderia sair sem seqüelas da campanha mais suja da história das eleições no período pós-redemocratização, e já estamos colhendo e vamos colher por muito tempo ainda os frutos plantados por quem não se furtou de rifar a própria biografia e se aliar ao que existe de mais sectário e reacionário na sociedade para se eleger presidente da república.

Parecia que o país tinha chegado a um nível de maturidade democrática que tornasse impossível a repetição do nível de baixaria da campanha de 1989, mas a campanha de 2010, com o Serra se aproximando de grupos neo-nazistas, integralistas, monarquistas e setores mais conservadores da igreja católica e templos evangélicos, conseguiu ser pior.

Os efeitos dessa aproximação puderam ser percebidos ainda durante a campanha quando bispos da CNBB se associaram a grupos de extrema direita para imprimir panfletos atacando o PT e Dilma, tentando assustar o cidadão mais suscetível a pregação do medo. A campanha de Serra também recrutou profissionais de destruição de reputação e insuflou os sentimentos mais rasteiros de uma fração da população acostumada a ter privilégios sobre os demais e que andavam insatisfeitos com a perda do status da exclusividade.

Logo após o anúncio do resultado das eleições, uma usuária do Twitter inconformada com a vitória da democracia, emitiu diversos comentários com conteúdo preconceituoso contra nordestino e fazendo apologia ao crime de racismo, inclusive sugerindo o assassinato dos mesmos. Não se trata de uma opinião inconseqüente de um pré-adolescente ou de alguém que não teve acesso à educação e, portanto poderia alegar ignorância sobre o que comentava. A usuária do Twitter tem pai com boa condição financeira e estuda em uma faculdade de direito.

A Procuradoria Geral da República analisa denúncias feitas por entidades de organização civil contra a usuária e vários outros usuários que multiplicaram o comentário criminoso ou fizeram outros comentários no mesmo nível, pelos crimes citados acima. O agravante para os crimes é o fato de terem sido cometidos através de um meio de comunicação, o que aumenta a pena caso a Procuradoria apresente a denúncia e o tribunal acolha a mesma e condene os acusados.

Se não bastassem essas manifestações que expuseram ao ridículo mais uma vez o nome do país no exterior, aparece um manifesto singelamente chamado de “São Paulo para os Paulistas”, que publicamente defende algo como um apartheid contra nordestinos, um tipo de xenofobia regional que se assemelha muito ao neo-fascismo que floresce atualmente na União Européia, algo que há bem pouco tempo era impensável como um movimento social no Brasil e se resumia a reduzidos grupos de neo-nazistas e integralistas que sempre funcionaram na clandestinidade em redutos nos grandes centros metropolitanos do eixo Sul-São Paulo.

Ontem, a Polícia do Rio Grande do Sul fez uma apreensão de farto material de um grupo neo-nazista, que incluía uma gravação com conteúdo fortemente racista, que ataca o sistema de cota raciais e associando negros à violência urbana. O vídeo continha ainda uma imagem do senador Paulo Paim, que defende direitos de minorias raciais, o que foi entendido pelo delegado que faz a investigação como um tipo de ameaça ao Senador. O DEM, representado pelo senador Demóstenes Torres contesta o sistema de cotas raciais no Supremo Tribunal Federal. O senador chegou ao cúmulo de afirmar, para argumentar que a sociedade brasileira não tem débito com a população negra, que não houve estupros nas senzalas durante o tempo em que vigorou a escravidão, mas “sexo consensual”.

Não há dúvidas que a extrema direita e esses grupos neonazistas e neofascistas vêem no consórcio PSDB/DEM seus legítimos representantes, assim como nos EUA o Tea Party se reconhece nos republicanos. Fica clara a intenção de importar para o Brasil e estimular em seguimentos da nossa sociedade elementos do conservadorismo religioso e anticomunista dos americanos.

Infelizmente essas são apenas as primeiras evidências do retrocesso que recebemos de herança da campanha suja de José Serra. O Ministério Público e a Polícia Federal vão ter muito trabalho daqui pra frente, espero que a punição para quem extrapole a lei seja dura para educar corretamente.

*Editor-geral do Blog do LEN e AMIGOS e coeditor do Terra Brasilis

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