Dois despachos confidenciais enviados pela embaixada norte-americana em Brasília a Washington no início de 2009 criticam a Estratégia Nacional de Defesa (END), plano que havia sido lançado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em dezembro de 2008. Esses documentos fazem parte das mais de 250 mil mensagens secretas interceptadas e divulgadas pelo grupo ativista Wikileaks.
Os despachos, dedicados à análise da END, foram enviados pelo então embaixador dos EUA no Brasil, Clifford Sobel. Neles, há críticas em relação ao anseio da Marinha brasileira de ter um submarino nuclear, e dúvidas sobre o modo como as forças armadas serão usadas futuramente, principalmente na proteção da região amazônica e da costa brasileira, após a descoberta das reservas de petróleo da camada do pré-sal.
"Não há nenhuma ameaça às reservas de petróleo brasileiras, mas os líderes brasileiros e a mídia têm citado as descobertas de petróleo no mar como razão urgente para melhorar a segurança marítima. Essa preocupação se fundiu à busca de duas décadas do Brasil por um submarino nuclear, dando um novo ímpeto à pesquisa sobre um pequeno reator para propulsão naval”, descreve uma das mensagens enviadas no dia 9 de janeiro de 2009, divulgada nesta quarta-feira (01/12) no site do Wikileaks
Clique aqui para acessar o primeiro documento enviado.
E aqui para o segundo.
O objetivo da END é a reestruturação da indústria brasileira de material de defesa e política de composição dos efetivos das Forças Armadas. O texto foi elaborado conjuntamente pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, e pelo então ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger.
Em relação à proteção da Amazônia, Sobel afirmou que a END possui "a tradicional paranóia brasileira" sobre atividades de ONGs e outras organizações estrangeiras, "percebidas como ameaças potenciais à soberania".
Para o diplomata, o plano de defesa do governo brasileiro não é uma estratégia, mas "um conjunto de ideias" sobre o papel dos militares no desenvolvimento do país, que não explica como será executado ou de onde virá o dinheiro. "Ainda não está certo quantas das recomendações vão ser implementadas", escreveu o ex-embaixador.
Equipamentos
O relato destaca também o interesse do Brasil em controlar tecnologia nos setores espacial, cibernético e nuclear. Mas critica a prioridade à indústria de defesa nacional, vista como "não competitiva". Nos despachos, consta ainda que o governo brasileiro “permite 'parceiros estratégicos', mas esses são vistos como os países que aceitam transferir tecnologias que tornarão o Brasil mais independente, não como um colaborador em operações de segurança”.
Para a diplomacia norte-americana, o objetivo de modernizar o setor militar no Brasil é “consistente”, mas é preciso “deixar de lado elefantes brancos politicamente populares como o submarino movido a energia nuclear".
O desejo de ter um submarino nuclear foi mencionado sete vezes nos dois telegramas e esse equipamento é listado como item que pode impedir a concretização da END. Porém, com três submarinos nucleares, a Marinha dos EUA é uma das que utiliza o equipamento atualmente.
"Há sérias questões sobre o quanto desse plano será realizado, particularmente com outras supostas prioridades estratégicas, incluindo submarinos nucleares e apoio governamental a empresas do setor de defesa que não sejam competitivas, algo que pode provocar o surgimento de buracos negros que vão sugar todos os recursos disponíveis", consta na mensagem.
A compra dos submarinos foi concluída em setembro de 2009. São quatro modelos convencionais Scorpène, francês, e o desenvolvimento do casco e da integração de um reator brasileiro a uma unidade com propulsão nuclear. A principal vantagem, segundo a Marinha, é que nestes tipos de embarcação, é possível permanecer por longos períodos submerso, o que não é possível quando o motor é movido a diesel.
Por fim, Sobel encerra a mensagem questionando se o projeto será materializado: "como muitas das recomendações não são concretas e precisariam de mais ação para desenvolver, resta ver quantas serão implementadas".
Do Opera Mundi
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