sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A Lei de Anistia de 1979 vale para quem torturou? - Parte II

Segundo consta no Brasil: Nunca Mais, o princípio de que "Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante." [Artigo 5º da Declaração Universal dos Direitos Humanos - ver íntegra da Declaração AQUI] não foi, em vinte anos de Regime Militar, respeitado pelos até, então, mandatários do país. Ao contrário, uma centena de formas e métodos diferentes de tortura foi largamente utilizada no combate aos que se opunham ao regime instalado e se encontravam na condição de presos políticos: agressão física, pressão psicológica, uso de diversos instrumentos. 

2. Modos e instrumentos de tortura

O "pau-de-arara"
(...) o pau-de-arara consiste numa barra de ferro que é atravessada entre os punhos amarrados e a dobra do joelho, sendo o "conjunto" colocado entre duas mesas, ficando o corpo do torturado pendurado a cerca de 20 ou 30 cm. do solo. Esse método quase nunca é utilizado isoladamente, seus "complementos" normais são eletrochoques, a palmatória e o afogamento. (...)
[...]

O choque elétrico
 (...) O eletrochoque é dado por um telefone de campanha do Exército que possuía dois fios longos que são ligados ao corpo, normalmente nas partes sexuais, além dos ouvidos, dentes, língua e dedos. (...)
(...) que foi conduzido às dependências do DOI-CODI [Departamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna], onde foi torturado nu, após tomar um banho pendurado no pau-de-arara, onde recebeu choques elétricos, através de um magneto, em seu órgãos genitais e por todo o corpo, (...) foi-lhe amarrado um dos terminais do magneto num dedo de seu pé e no seu pênis, onde recebeu descargas sucessivas, a ponto de cair no chão, (...)

A "pimentinha" e dobradores de tensão
(...) havia uma máquina chamada "pimentinha" [devido à sua cor vermelha], na linguagem dos torturadores, a qual era constituída de uma caixa de madeira; que no seu interior tinha um ímã permanente, no campo do qual girava um rotor combinado, de cujos terminais uma escova recolhia corrente elétrica que era conduzida através de fios que iam dar nos terminais que já descreveu; que essa máquina dava uma voltagem em torno de 100 volts e de grande corrente, ou seja, em torno de 10 amperes; que detalha essa máquina porque sabe que ela é base do princípio fundamental: o princípio de geração de eletricidade; que essa máquina era extremamente perigosa porque a corrente elétrica aumentava em função da velocidade que se imprimia ao rotor através de uma manivela; que, em seguida, essa máquina era aplicada com uma velocidade muito rápida a uma parada repentina e com um giro no sentido contrário, criando assim uma força contra eletromotriz que elevava a voltagem dos terminais em seu dobro da voltagem inicial da máquina; (...)
[...]
(...) dobradores de tensão alimentados à pilha, que, ao contrário do magneto, produzem eletricidade de alta voltagem e baixa amperagem, como as dos cinescópios de TVs; que, esta máquina produzia faísca que queimava a pele e provocava choques violentos; (...)

O "afogamento"
(...) O afogamento é um dos "complementos" do pau-de-arara. Um pequeno tubo de borracha é introduzido na boca do torturado e passa a lançar água. (...)
(...), e teve introduzido em suas narinas, na boca, uma mangueira de água corrente, a qual era obrigado a respirar cada vez que recebia uma descarga de choque elétricos; (...)
(...) afogamento por meio de uma toalha molhada na boca que constitui; quando já se está sem respirar, recebe um jato d'água nas narinas; (...)

A "cadeira do dragão", de São Paulo
 (...) sentou-se numa cadeira conhecida como cadeira do dragão, que é uma cadeira extremamente pesada, cujo assento é de zinco, e que na parte posterior tem uma proeminência para ser introduzido um dos terminais da máquina de choque chamado magneto; que, além disso, a cadeira apresentava uma travessa de madeira que empurrava as suas pernas para trás, de modo que a cada espasmo de descarga as suas pernas batessem na travessa citada, provocando ferimentos profundos; (...)
[...]

A "cadeira do dragão", do Rio
(...) o interrogado foi obrigado a se sentar em uma cadeira, tipo barbeiro, à qual foi amarrado com correias revestidas de espumas, além de outras placas de espuma que cobriam seu corpo; que amarraram seus dedos com fios elétricos, dedos dos pés e mãos, iniciando-se, também, então uma série de choques elétricos; que, ao mesmo tempo, outro torturador com um bastão elétrico dava choques entre as pernas e pênis do interrogado;
(...) uma cadeira de madeira pesada com braços cobertos de zinco ou flandres, onde havia uma travessa que era utilizada para empurrar para trás as pernas dos torturados; (...)

A "geladeira"
 (...) que por cinco dias foi metida numa "geladeira" na polícia do Exército, na Barão de Mesquita, (...)
(...) que foi colocado nu em um ambiente de temperatura baixíssima e dimensões reduzidas, onde permaneceu a maior parte dos dias que lá esteve; que nesse mesmo local havia um excesso de sons que pareciam sair do teto, muito estridentes, dando a impressão de que os ouvidos iriam arrebentar; (...)
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Fonte: Brasil: Nunca Mais. prefácio Dom Paulo Evaristo Arns, 13a. ed., Petrópolis, RJ, Vozes, 1986, pp. 34-37

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