sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Uma pauta do bem

Turismo acessível: Pessoas com deficiência também querem viajar

Por Jailza Valença e Renata Lundgren*

Sair da rotina, conhecer novos lugares e culturas, divertir-se, comer em bons restaurantes, participar de eventos são fatores que motivam a escolha de um destino para viajar; mas não são os únicos. Questões de ordem financeira, pessoais e de preparo do local para receber o turista também influenciam na decisão por determinado roteiro. No caso de pessoas com deficiência, planejar uma viagem vai muito além dos seus interesses e possibilidades. É necessário saber se a cidade possui adaptações que permitam recebê-las.

O turismo é uma das atividades econômicas que mais cresce no mundo e representa o movimento de pessoas do seu lugar de residência para outro de interesse. Na teoria, esse é o conceito geral do termo, mas na prática, para quem possui algum tipo de limitação física ou mental, essa explicação pode ser interpretada como
a realização de viagens para local diferente da sua moradia e que permita esse deslocamento. “É frustrante pensar que não posso viajar, pois a maioria dos lugares não são acessíveis aos cegos, o que me impede de desfrutar do lazer e fazer deslocamentos sozinha”, lamenta a professora aposentada, Euricléia Trajano.
           
Qual seria, então, a alternativa para mudar essa realidade? Como permitir que todo cidadão usufrua dos serviços turísticos? A solução está na palavra-chave: acessibilidade. Esse termo, aparentemente tão complexo, pode ser traduzido como a possibilidade de uma mulher grávida embarcar no ônibus (e passar pela roleta) sem nenhuma dificuldade; um cego cruzar a rua sozinho orientado pelo sinal de alerta do semáforo; um cadeirante circular, por conta própria, pela cidade; um surdo ter os filmes no cinema apresentados em libras. Acessibilidade, portanto, é a garantia plena do direito de ir e vir.

Uma forma de permitir que todas as pessoas tenham acesso aos mais diversos espaços está na
construção de meios físicos com base no conceito de desenho universal. Segundo o engenheiro civil, Alexandre Whatley Dias, a expressão refere-se ao projeto de ambientes, equipamentos e serviços que possam ser usados por todos, sem necessidade de adaptação específica para pessoas com deficiência. “O desenho universal deve ser totalmente aplicado às cidades que desejam explorar o turismo, pois elas têm que estar preparadas para receber todo tipo de gente, sem nenhuma distinção”, enfatiza.   


Essa nova concepção dos lugares, projetados para receber os indivíduos independente de suas habilidades, tem uma nomenclatura própria no setor turístico, conhecida como turismo acessível e/ou inclusivo. De acordo com o professor do curso de turismo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE), Gustavo Estevão, isso não representa um segmento específico, como turismo de sol e praia ou turismo cultural, mas uma adequação de todos os serviços e produtos turísticos com o objetivo de atender as exigências de qualquer cliente.

CONSUMIDORES EM POTENCIAL

Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que, no mundo, aproximadamente 650 milhões de pessoas possuem alguma deficiência. No Brasil, segundo o Censo 2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são quase 30 milhões de habitantes. Em Pernambuco os números apontam para 17,3% da população. A indústria do turismo, atenta a esses números, percebeu uma demanda em potencial para os seus negócios.
          
“Em qualquer lugar do mundo, em qualquer faixa de idade, há pessoas com deficiência e mesmo com as suas dificuldades, elas querem ser turistas e estão dispostas a pagar pelos serviços”, ressalta o professor do curso de turismo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE), Gustavo Estevão. Diante deste cenário, alguns destinos estão direcionando suas ações para conquistar esse novo público. “Com a competitividade no setor turístico mundial, buscar um diferencial competitivo no mercado é fundamental para conquistar e fidelizar clientes”, destaca o economista Sérgio Paixão.
           
Países como Espanha
, Canadá, França e Estados Unidos, atentos às novidade do mercado, decidiram empreender na área do turismo inclusivo. A estrutura criada por eles, para atender às necessidades dos portadores de deficiência, é referência para os demais lugares. A oferta de serviços disponibilizada por esses países inclui toda uma preocupação com as normas de acessibilidade e qualidade no atendimento. “Em algumas cidades do mundo, já é possível desfrutar de serviços turísticos acessíveis. Citando alguns exemplos, temos pacotes de turismo de aventura para cadeirantes, museus voltados para cegos, aluguel de carro adaptado, hotéis projetados com base no desenho universal, entre outros”, acrescenta o geógrafo e tecnólogo em gestão de turismo, Edvaldo Dias.
           
No Brasil, pequenas iniciativas no âmbito da acessibilidade no turismo já podem ser observadas, mas o país ainda não possui estrutura suficiente para atender os deficientes de maneira segura e confortável. Mesmo com orientações de leis e decretos de acessibilidade turística, poucos são os destinos brasileiros que
estão se adequando a essas exigências legais. “O Brasil está engatinhando na questão do turismo acessível e falta muito para dar os primeiros passos”, comenta a técnica em turismo, Olga Fernandes.
           
Marize mostra algumas adaptações de sua casa
A bacharel em teologia, Marize Barros, é uma amante das viagens e o fato de usar uma cadeira de roda não a impede de aproveitar bons momentos de lazer e turismo. “Na infância tive paralisia e perdi o movimento das pernas, mas isso não é justificativa para eu ficar presa em casa”, explica. Ela já visitou vários estados no Brasil e recomenda alguns lugares que já têm uma preocupação com a acessibilidade. Brasília (DF), João Pessoa (PB), Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR), Bonito (MS), Socorro (SP) e São Carlos (SP) são exemplos indicados por Marize. Há, sobretudo, um destaque para Curitiba que ela afirma ser a cidade mais bem preparada para receber os deficientes. “O Brasil está começando a repensar a acessibilidade, mas para uma pessoa como eu ficar totalmente independente ainda falta muito”, ressalta.

* Renata Lundgren, a quem tive o prazer de ensinar, é estudante de jornalismo da Faculdade Maurício de Nassau.

Leia mais no JORNALISMO DO BEM.

Um comentário:

Renata Lundgren disse...

Fiquei estremamente feliz em saber que um texto que fiz com tanta dedicação e que levei quase um semestre conclui-lo está ocupando o espaço de uma postagem desse blog que é de uma pessoa que admiro muitíssimo como profissional da nossa língua mãe e crítico das mais diversas situações da nossa sociedade. Prof levei o semestre inteiro para fazer as apurações, entrevista, pesquisas e fotos. Agora já estou conlhendo bons frutos do meu esforço e não há presente maior do que o reconhecimento de pessoas de credibilidade como o senhor.
Abraços e sempre estarei por aqui.

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