sábado, 23 de abril de 2011

Clichê Armado [Crítica à novela "Amor e Revolução"]

Atuações constrangedoras, diálogos inverossímeis e equívocos históricos. Estes são alguns dos ingredientes básicos – mas não exclusivos – de “Amor e Revolução”, novela da vez do SBT, que retrata a repressão a militantes de esquerda durante a ditadura (1964-1985). A crítica tem sido arrasadora e a audiência derrapa. Um fracasso total? Quase.

O mérito da novela é escancarar um tema ainda tabu, como indica um dos ataques mais irados contra o folhetim, vindo de militares de pijama congregados na Associação Beneficente dos Militares Inativos e Graduados da Aeronáutica (ABMIGAer), sediada em Belo Horizonte. Indignados, os militares reformados lançaram um abaixo-assinado na internet em que pedem a censura à novela do SBT.

No texto, os militares evocam a Lei da Anistia, ignorando que ela não instituiu nenhum tipo de cerceamento a informações sobre o período. Também destilam teorias conspiratórias ao insinuar um acordo entre Silvio Santos e o governo Dilma Rousseff. Um se livraria da dívida do Panamericano e o outro conquistaria apoio popular para a criação da Comissão da Verdade, cuja finalidade é esclarecer as violações de direitos humanos praticadas durante a ditadura. Que brisa…

O argumento da associação é que a a novela pode colocar o povo contra as Forças Armadas. Difícil avaliar o impacto dela na popularidade da farda, mas é certo que torturadores e assassinos têm razão para desassossego. A brutalidade da ditadura está na telinha.

Mas a realidade, como sempre, supera a ficção – e os clichês também. Ao fim de cada capítulo, a novela apresenta depoimentos em que personagens reais narram os horrores de que foi capaz a ditadura. Embora a fórmula seja copiada de Manoel Carlos, o tema vem com profundidade nunca exibida antes na TV. É o que se salva de “Amor e Revolução”, e o que mais incomoda os saudosos da linha dura.  A novela põe na sala da galera um assunto que defensores do regime militar se esforçam para que repousem no esquecimento, tentando reeditar o expediente mais perverso e longevo dos anos de chumbo: a censura.

Ainda que tocada num ritmo de dramalhão mexicano supertrash e a avacalhar a luta armada, “Amor e Revolução” nos ajuda a encarar o passado. E iniciativas como a da ABMIGAer, no máximo, trazem mais atenção à trama, talvez a indicar que o vento sopra a favor da elucidação dos crimes nas masmorras da ditadura. Resta torcer para que a discussão sobreviva à novela.

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