Governo Dilma impõe jogo duro aos partidos e tenta fugir de votações rotineiras no Congresso, para fazer menos concessões a aliados. Em pouco mais de quatro meses, já deu diversos sinais de que tenta fugir de negociações cotidianas com parlamentares. Para o Planalto, Congresso deve se dedicar a “grandes questões estruturais”, como as reformas política e tributária. Estratégia montada pelo chefe da Casa Civil revolta partidos e deixa governo desconfiado de que há 'fogo amigo' por trás da notícia de que Antonio Palocci comprou imóvel milionário às vesperas assumir ministério.
André Barrocal
BRASÍLIA – O governo Dilma Rousseff está decidido a depender menos do Congresso, para não ter de fazer tantas concessões a aliados, como ocorreu com os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. A estratégia tem causado revolta nos partidos, sobretudo nos maiores, PT e PMDB, que perdem poder de pressão e não conseguem reagir, apenas reclamar nos bastidores. E, segundo avaliações dentro do Palácio do Planalto, estaria na origem da notícia de que o chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, identificado como ideólogo da nova postura, comprou imóvel de R$ 6 milhões no fim de 2010, tendo recebido R$ 1 milhão como deputado em quatro anos.
A relação Planalto-Congresso praticada até agora desagrada parte da base aliada da presidenta Dilma, segundo uma fonte governista, porque enfraquece partido que sonha em ver um indicado ocupando cargo num ministério ou numa empresa estatal e permite ao governo levar adiante uma política de nomeação “a conta gotas”.
Em pouco mais de quatro meses, o governo já deu diversos sinais de que quer fugir de negociações cotidianas com parlamentares. A lei que estabelece reajuste automático do salário mínimo em quatro anos, aprovada em fevereiro pelo Congresso, diz que o valor será fixado por decreto presidencial. Até então, dependia todos os anos de lei votada no Legislativo. O aumento por decreto foi concebido na Casa Civil.
Foi lá, também, onde se planejou que a presidenta Dilma use menos medidas provisórias (MPs). Até maio, ela baixou doze, uma a cada onze dias, em média. Em dois mandatos, o ex-presidente Lula assinara 418 MPs, média de uma por semana. Como toda MP precisa passar pelo Congresso, menos MPs significa menos votações. Uma das MPs de 2011 define regras de correção instantânea da tabela do imposto de renda até 2014. Outra vez, o governo foge de negociar com parlamentares ano a ano.
Para o Planalto, o Congresso deve se dedicar a “grandes questões estruturais”, como as reformas política e tributária. E até no caso da reforma tributária, tentará usar da estratégia de “depender menos” do Legislativo. Só fará uma proposta de mexer na Constitutição, que exige mais votos para passar do que uma lei comum. E, mesmo assim, será uma ideia de interesse patronal - alterar a contribuição das firmas à Previdência Social -, levando o empresariado a cobrar a votação dos congressistas.
Proteção contra retaliações
A estratégia do governo de evitar o Congresso sempre que puder reduz a chance de parlamentar ou partido retaliar o governo, votando contra propostas do Executivo, caso esteja insatisfeito, por exemplo, com a falta de nomeações de apadrinhados ou o represamento de dinheiro de emendas. Ao mesmo tempo, libera a presidenta Dilma para montar uma equipe mais técnica e com menos influência política.
Desde o início do ano, é comum encontrar na imprensa notas ou reportagens sobre o mal estar de partidos com o governo pela demora na nomeação de indicados. Quase sempre com PT e PMDB, os dois maiores, citados como aborrecidos.
Também há contrariedade geral dos partidos com a decisão do governo de, no esforço de controlar a inflação neste ano, cortar do orçamento R$ 18 bilhões em verba de obras defendidas por deputados e senadores. E de cancelar de R$ 5 bilhões em emendas de 2007 a 2009 que ainda não tinham sido pagas.
Nos bastidores do Congresso, pode-se ouvir, de petistas e peemedebistas, que "está faltando carinho do governo com o Congresso”, que "o governo não devia deixar prosperar a ideia de desprezo pelo Congresso”, e que "ninguém consegue falar com o Palocci, nem o PT”.
“De fato, há uma estratégia em curso: o governo quer depender o mínimo possível do Congresso. Sem uma alternativa de poder no horizonte da oposição, pode dar certo”, analisa o cientista político Antonio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), um dos maiores conhecedores da alma do Congresso. “Só mesmo uma crise de grandes proporções, envolvendo um grande personagem do governo, pode mudar isso”, completa.
Fogo amigo e oposição
O atual episódio Palocci não chega a ser uma “crise de grandes proporções”, na visão do governo, mas certamente envolve “um grande personagem do governo” e deixa o Planalto desconfiado de que a notícia nasceu do acúmulo de aliados contrariados. O conhecido 'fogo amigo". Em Brasília, sabe-se que dificilmente existe uma denúncia da imprensa se não houver alguém querendo prejudicar alguém que sopre uma história ou uma dica para um jornalista.
Segundo o jornal Folha de S. Paulo, Palocci adquiriu, no fim de 2010, um apartamento na capital paulista por R$ 6 milhões. A operação seria incompatível com a renda amealhada por ele como deputado entre 2007 e 2010, de R$ 1 milhão, fora os descontos fiscais.
Em nota da assessoria de imprensa da Casa Civil, o ministro diz que comprou o imóvel com dinheiro que ganhou prestando consultoria econômica e financeira, entre 2006 e 2010, em uma empresa de nome Projeto, da qual é sócio com 99% das ações. Antes de virar ministro, prossegue a nota, Palocci mudou os objetivos da Projeto. Como sócio de consultoria, ele não poderia assumir a Casa Civil, por potencial conflito de interesses. Hoje, a firma tem como missão cuidar do patrimônio imobiliário do ministro.
Os partidos adversários do governo – PSDB, DEM e PPS – estão tentando explorar o assunto para desgastar o ministro mais forte do governo Dilma. O presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE), disse em entrevistas à imprensa que seria necessário esclarecer quem pagou pelas consultorias de Palocci. O líder do DEM na Câmara dos Deputados, Antonio Carlos Magalhães Neto (BA), afirmou à imprensa que quer que Palocci vá a uma comissão da Câmara prestar esclarecimentos.
O PPS deseja o mesmo. Nesta segunda-feira (16/05), entrou numa comissão da Câmara com pedido de convocação de Palocci. Quem o encaminhou foi o deputado Moreira Mendes (RO), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, também conhecida como bancada ruralista. Mendes defende a votação imediata do projeto que muda o Código Florestal, para que os produtores rurais não sejam multados por terem desmatado, no passado, acima do que a lei permite.
A votação do Código Florestal tem sido administrada pelo governo, com Palocci à frente, com jogo duro e guerra de nervos, igualmente gerando descontentamento entre aliados já contrariados. O PMDB, que controla o ministério da Agricultura, interlocutor dos grandes agropecuaristas, defende a votação. O PT, que dirige o ministério do Desenvolvimento Agrário, interlocutor dos pequenos agricultores, também. Todos os agropecuaristas, não importa o tamanho da propriedade, cobram a mudança.
O PPS também vai pedir, nesta terça-feira (17/05), que a Procuradoria Geral da República investigue Palocci e que Comissão de Ética Pública da Presidência da República abra uma sindicância contra ele. O presidente da Comissão de Ética, Sepúlveda Pertence, já opinou sobre o caso, nesta segunda-feira (17/05). Para ele, a notícia refere-se a fatos anteriores à ida de Palocci para o governo, logo, a Comissão não teria o que investigar. Só terá se as informações dadas pelo ministro à Comissão, antes de ele entrar no governo, sobre a situação da empresa Projeto, estiverem incorretas.
Depois da declaração de Pertence, o chefe da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, considerou que o assunto "está encerrado". O governo vai tentar impedir a aprovação de qualquer proposta de que Palocci vá ao Congresso prestar esclarecimentos.
2 comentários:
O caso Palocci "não é crise de grandes proporções"? Apenas na visão deste Governo. O caso Alécio foi tratado como "o fim do mundo"!
Caro Alberto,
Em se confirmando [presunção de inocência, mesmo que desconfiemos que o sujeito é culpado, é um instituto democrático - nunca se esqueça disso]a ilicitude no crescimento do patrimônio do Palocci, não tenha dúvida de que o episódio envolvendo Aécio Neves é infinitamente desporporcional [ainda é necessário esclarecer a origem do veículo, lembra?!?!].
Como disse, não estou aqui para defender ninguém do PT ou de qualquer outro partido que por ventura tenha se metido em corrupção.
Grande abraço!
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