sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Zara não comparece à Assembleia Legislativa; CPI é defendida

Enrique Huerta Gonzalez, presidente da Zara Brasil, não atendeu ao convite para tratar, em comissão do Legislativo estadual, dos flagrantes de escravidão na cadeia produtiva da marca. CPI do trabalho escravo recebe mais apoios

Por Bianca Pyl e Maurício Hashizume

São Paulo (SP) - Convidado a prestar esclarecimentos sobre a exploração de trabalho escravo na fabricação de peças de roupas da Zara, o presidente da marca no Brasil, Enrique Huerta Gonzalez, não compareceu à reunião da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), no início da tarde desta quarta-feira (31).

Os sócios administradores da empresa AHA - que atuava na intermediação entre a Zara e as oficinas de costura subcontratadas onde imigrantes sul-americanos foram encontrados em condições análogas à escravidão - também não estiveram presentes para tratar do assunto no Legislativo estadual.

Identificações dos convidados e cadeiras vazias na reunião da comissão da Alesp (Foto: MH)

Em comunicado, a Zara Brasil declarou que, em função do "curto período de tempo entre o recebimento do convite e a data da reunião", o presidente da filial brasileira da companhia espanhola, que faz parte do grupo Inditex, "encontra-se impossibilitado de comparecer perante a comissão". À Comissão, a Zara informou complementarmente que o executivo estava cumprindo agenda fora do país e sugeriu que o compromisso com os membros da Alesp fosse transferido para outra data posterior a partir de 23 de setembro.

Os advogados da AHA também protocolaram documento em que atribuem a ausência dos sócios ao "tempo exíguo" e pediram que sejam notificados com menos 15 dias de antecedência. Apresentados pelo deputado Carlos Bezerra Jr. (PSDB), os requerimentos de convite aos responsáveis legais pelas empresas envolvidas foram aprovados na segunda-feira (29).

As "cadeiras vazias", segundo Carlos Bezerra Jr., só comprovam a gravidade das denúncias. "Se não respeitam nem os direitos humanos dos trabalhadores, essas empresas também não vão respeitar essa Casa", comentou. Para que as ausências não se repitam, ele defende a instalação imediata de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Trabalho Escravo para apurar não apenas o caso envolvendo a Zara, que faz parte de um dos maiores grupos têxteis do mundo, mas também o conjunto das diversas questões relacionadas à ocorrência de escravidão no Estado mais rico do país, em pleno século XXI.

Uma CPI tem a prerrogativa de fazer convocações, e não apenas convites, e conta ainda com suporte do aparato policial. "Eles não estão aqui porque não é uma CPI", sustentou Carlos Bezerra Jr., que também é vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana. A proposta da CPI, de autoria do mesmo, já recebeu o apoio necessário de assinaturas dos membros da Alesp e foi protocolada na semana passada.

O deputado estadual, que é médico e foi vereador da capital até 2010, frisou a necessidade de que os envolvidos façam um esclarecimento público sobre a manutenção de pessoas (incluindo uma adolescente de 14 anos) em condições análogas à escravidão, impedidos de ir e vir, em condições degradantes, sob jornadas exaustivas etc.

"É só a ponta do iceberg. Esquemas como esses podem estar associados a outros crimes como o tráfico internacional de pessoas, à exploração sexual, inclusive de adolescentes e de crianças, além da questão do trabalho infantil", adicionou Carlos Bezerra Jr., que destacou ainda que a Assembleia Legislativa está diante de uma oportunidade histórica de contribuir no combate ao "gravíssimo" crime contra a violação de direitos humanos. "Não se pode permitir que isso continue acontecendo no nariz da sociedade paulistana".

Durante a reunião marcada pela ausência dos convidados das empresas, o deputado Ênio Tatto (PT), que é líder do partido que representa na Casa, reiterou o apoio da bancada petista à CPI. Sem isso, advertiu, os envolvidos tendem a "não comparecer e fugir do debate". Para o líder petista, o regimento - que estabelece como limite a instalação de cinco CPIs concomitantes - pode ser alterado para que a CPI do Trabalho Escravo, por conta de seu caráter extraordinário, passe a funcionar na Alesp.

De acordo com Ênio Tatto, todos os líderes se manifestaram favoravelmente à alteração por meio de um projeto de resolução, diante da urgência e da gravidade do tema. Nas palavras do petista, porém, o líder do governo, Samuel Moreira (PSDB), teria apontado, de "forma estranha", a existência de problemas quanto aos ajustes no regimento, inclusive trazendo a tona a existência de uma "ordem cronológica" para a criação de CPIs, pois vários outros pedidos foram firmados além das cinco que já estão instaladas: do ensino superior privado e da TV por assinatura, que estão em funcionamento; e da remuneração dos médicos pelos planos de saúde, da contratação de serviços odontológicos por planos de saúde e do consumo de álcool, que estão sub judice.

Leia mais no Repórter Brasil

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...