A arrogância com que a emissora tratou a reação do público ao episódio entre Daniel e Monique é prova de que ela continua se achando acima de tudo e todos.
Desde o último domingo vemos como a maior emissora de televisão
brasileira não está preparada para lidar com o público de seu programa
mais popular. O Big Brother Brasil da Tv Globo está em sua décima
segunda edição e pela primeira vez virou caso de polícia. Na madrugada
do dia 15, dois participantes (Monique e Daniel) protagonizaram cenas
que para muitas pessoas que assistiam o programa naquele momento
pareceram ser de um estupro. O programa havia começando há menos de uma
semana. As redes sociais explodiram em denúncias, reclamações,
xingamentos, discussões, machismo, racismo, misoginia, moralismo e
muitas cobranças. E um dos elementos que mais marcou esse caso foi a
falta de transparência da emissora para lidar com algo que gerou
repercussão negativa para a empresa e patrocinadores.
É claro que várias pessoas já fizeram sexo no BBB em outras edições.
Porém, foi a primeira vez que uma das pessoas envolvidas parecia estar
muito bêbada e desacordada. Apenas as pessoas que assinam o pay-per-view assistiram
ao vivo. Vídeos com as cenas correram pela rede, com a Globo logo atrás
retirando-os do ar por violação de direitos autorais. O site oficial
não disponibilizou os vídeos. Esse descaso em relação às denuncias foi o
que mais marcou. Durante a manhã do domingo, 15, o diretor do programa negou a violência sexual e afirmou que estava descartada a expulsão de Daniel. No programa ao vivo, a edição mostrou o caso como um romance e o apresentador Pedro Bial arrematou dizendo: “o amor é lindo”. Ficou mais do que provado que de reality show
o programa não tem nada, pois é totalmente controlado. A emissora
provou que pode impor sua versão dos fatos e ignorar totalmente todas as
manifestações feitas na internet.
Na segunda-feira, a polícia civil do Rio de Janeiro decide investigar o caso. A Rede Globo negocia com os policiais o depoimento de Monique e Daniel. O áudio do depoimento de Monique vaza, ninguém sabe como, o caso parece ter se tornado o BBBGate. No mesmo dia, Daniel é eliminado do programa devido a um grave comportamento inadequado, segundo nota oficial da emissora. No programa ao vivo, Pedro Bial anuncia a eliminação de Daniel,
mas sem citar o motivo. Não menciona o suposto caso de estupro, nem a
ação da polícia, nem como os outros participantes receberam a notícia.
Quem informou o público do programa – que não possui pay-per-view e que não acessou informações na internet – foi uma matéria do Jornal Nacional. A impressão é de que os participantes estavam proibidos de falar sobre o assunto. O que descobrimos ser verdade com as declarações de Analice, primeira a sair do BBB.
Sabemos que Monique não viu os vídeos com as cenas que causaram
tantos questionamentos. Sabemos que ela nunca afirmou publicamente que
tudo foi consensual. O que temos são relatos de seus depoimentos ao
diretor do progama e ao delegado. Ela não pode falar com os outros
participantes sobre o assunto, não tem contato com sua família ou amigos
e terá que elaborar sozinha o que aconteceu. Chega a ser absurdo uma
pessoa que está diretamente envolvida com os fatos ser obrigada a ficar
totalmente alheia à questão, que provavelmente gera inúmeras dúvidas e
questionamentos. Porém, Monique é adulta e, se permanece no programa, é
por decisão própria. O caso está sendo investigado pela polícia, e
Daniel pode ou não ser indiciado.
Mas e a Globo? Até hoje nada foi informado sobre o caso no programa
ao vivo além da eliminação de Daniel. Os diretores e editores já
mostraram que vão dar a versão que quiserem para os acontecimentos.
Inclusive, já criaram um novo romance para Monique.
E a recusa inicial em investigar seriamente o caso mostra que há uma
imensa prepotência da emissora frente às manifestações públicas
contrárias a seus interesses. Mas está claro que as pessoas não
aceitarão qualquer versão dos fatos. A emissora pode ter sido a única
fonte de informação disponível por décadas, mas a internet mostra-se
cada vez mais como espaço que pode subverter o monopólio dos grandes
grupos midiáticos.
Há o notório caso em que a Globo é acusada de manipular o debate
entre os candidatos Collor e Lula nas eleições presidenciais de 1989. Há
outros casos em que ela tentou escrever a história do Brasil de acordo
com seus interesses, como nas Diretas Já. Com essa edição do Big Brother
Brasil, temos uma prova de que ela não só continua se sentindo acima de
tudo e todos, como aperfeiçoou seu modo de operar nesse sentido. Não
escutou as redes sociais, as críticas e muito menos respeitou os
participantes do programa. Em qualquer reality show, é possível
acontecer uma situação como essa. Se o estupro for confirmado, Daniel
terá cometido um ato que muitas pessoas em nossa sociedade não
condenariam, por mais que seja um crime. O debate sobre a questão do date rape foi
um dos pontos positivos nessa profusão de notícias dos últimos dias. O
outro foi que a denuncia de estupro partiu da própria audiência. Isso
mostra que, por mais que o Big Brother talvez seja um entretenimento
vazio, baseado em baixaria, como tantas pessoas reclamam, seu público –
especialmente o que está presente na internet – está de olhos abertos
para possíveis casos de violência e abuso.
A confusão levanta inúmeras questões em relação à responsabilidade
que a Rede Globo tem. Sempre soubemos que poderiam haver brigas nos reality shows,
mas acho que nunca pensamos que um crime tão grave como um estupro
poderia ser transmitido em tempo real. Acreditamos que, por estarem na
televisão, as pessoas não se excederão tanto. Acontece que, não só a
Globo, mas também outros canais que possuem concessão pública, exploram a
estimulação do combustível álcool + sexo em seus programas.
Por fim, uma observação que seria cômica, se não refletisse a falta
de responsabilidade das emissoras de televisão em relação à sociedade e
as fracas regras que regulam as concessões públicas de televisão. O
Ministério das Comunicações também entrou no caso.
Solicitou à Globo as gravações. As imagens serão analisadas e, se
estiverem em desacordo com as finalidades educativas e culturais da
radiodifusão e com a manutenção de um elevado sentido moral e cívico, as
infrações serão apuradas, podendo resultar na interrupção dos serviços.
Quantos programas veiculados em canais abertos, ou mesmo em canais
fechados, estão em acordo com as finalidades educativas e culturais da
radiodifusão? Não me atrevo a tentar definir o que seria um programa com
elevado sentido moral e cívico, mas o fato é que no momento estamos em
luta com uma empresa que detém o maior monopólio de informação do país. E
com esse affair BBB, podemos ter ganho uma batalha importante.
Talvez a Globo perceba que seu público não é mais o mesmo, que as
informações não podem mais ser controladas como antes e que as reações
são imediatas nas redes sociais. Mas apenas talvez. Pela postura
arrogante e centralizadora que acabamos de ver, o provável é mesmo que
ela perca o jato da revolução digital.
Um comentário:
Com certeza a globo fará de tudo para convencer q não houve nada, talvez até a justiça se convença com um bom dinheiro.
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