terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A nova ameaça dos Estados Unidos

Por Mauro Santayana

Com as prévias dos republicanos em Iowa, iniciou-se o processo eleitoral norte-americano. Barack Obama não pôde ou não quis cumprir suas promessas de candidato, durante o primeiro mandato. Provavelmente, além do cerco da direita republicana e de seu próprio partido, lhe tenha faltado o carisma, esse atributo necessário aos grandes líderes a fim de mobilizar o povo, sobretudo na sociedade mitológica dos Estados Unidos. O mundo grego foi criado a partir dos deuses e titãs; os Estados Unidos se construíram na eliminação dos nativos e se consolidaram com a invenção dos rangers texanos e dos cowboys da fronteira do sudoeste. A violência é um dos fundamentos da alma norte-americana. 

Obama não parecia esculpido desse mesmo barro e poderia ter sido o homem destinado a liderar novo ciclo de esquerda na história norte-americana, como foram os períodos de Jackson, Lincoln, Cleveland, Wilson e Franklin Roosevelt. A realidade demonstrou que, se o povo podia mudar os rumos do país, Obama não conseguiu ser o líder que ele esperava. 

Obama não é o melhor para o seu país nem para o mundo, mas seu sucessor republicano – se a direita vencer em novembro – será ainda pior. Mitt Rommey, que ganhou, por pouco, o “caucus” do Iowa e, provavelmente, será vencedor das primárias de New Hampshire, é visto como “moderado”, de acordo com seu desempenho como governador de Massachusetts. No entanto, para agradar ao eleitorado mais conservador, Rommey está se alinhando à extrema direita. Os sinais, com o fraco desempenho do Tea Party, e a divisão dos republicanos, na prévia de Iowa, estão indicando a reabilitação de Barack Obama. Ele pode não ser o melhor, mas qualquer republicano seria pior. 

Obama acaba de anunciar a redução dos gastos militares norte-americanos, mas não se trata de alívio para o mundo, e sim, de nova ameaça. O presidente reafirma o velho panfleto do “Destino Manifesto”, ao assegurar que os Estados Unidos, com tal medida, não irão perder a hegemonia, mas, ao contrário, consolidá-la. Parte do projeto – vista como claro desafio aos chineses – é o de aumentar a presença dos Estados Unidos na Ásia. Mas continuarão a exercer sua influência na América Latina, e a usar mais recursos tecnológicos e menos homens nos combates e na ocupação. Em suma, pretendem usar armas de destruição em massa teleguiadas, como as bombas-voadoras recentemente testadas, robôs manejados do Pentágono para a ocupação de áreas “inimigas”, guerra no ciberespaço, mais espionagem ainda, operações clandestinas para a eliminação de adversários no exterior e, embora não esteja explícita, a guerra biológica. As linhas básicas são as de “combate ao terrorismo” e de proibição do acesso à tecnologia nuclear e outras. 

O projeto, do Secretário de Defesa, pode parecer efetivo, mas, do ponto de vista estratégico, é menos convincente. O que determina a ocupação militar é o pé do soldado, e o que consolida a vitória é a conquista política dos povos inimigos. Essa conquista política, apesar dos embasbacados admiradores do american way of life, parece descartada no horizonte histórico. 

Para nós, latino-americanos, asiáticos e africanos, o que importa é a resistência à auto-arrogada hegemonia de Washington, com o retorno ao velho princípio da autodeterminação dos povos e da não intervenção nos assuntos internos dos países soberanos. No caso do Brasil, é necessário reafirmar a necessidade de fortalecimento de nossa capacidade de defesa, da qual nos descuidamos por falta de recursos durante o fim do governo militar e durante o governo Sarney, e por opção capitulacionista de Collor e Fernando Henrique. 

Todos os esforços de qualquer nação se dirigem a um objetivo comum: o de garantir a soberania contra a agressão militar e as pressões diplomáticas do exterior. O Brasil é um dos países que menos gastam com a defesa e, por isso mesmo, vulnerável a um ataque estrangeiro, pelo menos no primeiro momento. É certo que a potencialidade do país para rechaçar qualquer invasão é imensa, tendo em vista sua dimensão territorial e o patriotismo de seu povo, que não de suas elites. É verdade que grande parte da sociedade, ainda traumatizada pelo regime militar, vê com reservas o fortalecimento das Forças Armadas. É preciso, sim, promover seu profissionalismo, retomar as pesquisas tecnológicas e incentivar os compromissos nacionalistas de seus quadros, afastando-os de perniciosas influências estrangeiras. Devemos gastar o que for necessário para prepará-las para o pior – o que é sempre uma eventualidade.

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