18 anos sem reparação dos crimes contra a Escola Base
Do Última Instância
Passados 18 anos, professora da Escola Base ainda não sabe quando vai receber indenização
Felipe Amorim - 22/03/2012 - 09h06
Dezoito anos atrás, os donos da Escola de Educação Infantil Base, na
zona sul de São Paulo, foram chamados de pedófilos. Sem toga, sem corte e
sem qualquer chance de defesa, a opinião pública e a maioria dos
veículos de imprensa acusaram, julgaram e condenaram Icushiro Shimada,
Maria Aparecida Shimada, Mauricio Alvarenga e Paula Milhim Alvarenga.
Leia mais:
Caso da Escola Base completa 10 anos sem pagamento de indenização
Chegou-se a noticiar que, antes de praticar as ações perversas, os
quatro sócios cuidavam ainda de drogar as crianças e fotografá-las nuas.
"Kombi era motel na escolinha do sexo", estampou o extinto jornal
Notícias Populares, editado pelo Grupo Folha. "Perua escolar carregava
crianças para a orgia", manchetou a também extinta Folha da Tarde.
Na esfera jurídica, entretanto, a história tomou
outros rumos. As acusações logo ruíram e todos os indícios foram
apontados como inverídicos e infundados. Mas era tarde demais para os
quatros inocentados. A escola, que já havia sido depredada pela
população revoltada, teve que fechar as portas.
Hoje, acumuladas quase duas décadas de reflexão e autocrítica, a
mídia ainda não conseguiu digerir o ocorrido e o caso da Escola Base
acabou se tornando o calcanhar de Aquiles da imprensa brasileira — é
objeto constante de estudo nas faculdades de jornalismo — e motivo de
diversas ações judiciais provocadas pelos diretores da escola.
Em uma delas, Paula Milhim, antiga professora e coordenadora
pedagógica da Escola Base, tenta por as mãos na indenização de R$ 250
mil que ganhou na Justiça paulista. Com a repercussão do caso, Paula
perdeu o emprego, se afastou da família, e hoje acumula dívidas em um
emprego instável como auxiliar administrativa.
O decreto de Covas
Em função de diversos atrasos para iniciar a ação judicial, a indenização a que Paula tem direito esteve à beira da prescrição. Para piorar, no momento em que a sua defesa estava formada e instrumentalizada, um ataque cardíaco fulminante vitimou o seu advogado e atrasou ainda mais o processo.
Laércio José dos Santos, seu atual (e terceiro) advogado, só teve
acesso ao processo em 1999, após ter expirado o prazo de cinco anos —
que consta no Código de Processo Civil para requisição de ação
indenizatória.
Antes que a prescrição fosse oficialmente validada, o então
governador de São Paulo Mario Covas publicou em 15 de dezembro de 1999 o
decreto número 44.536, em que escreveu:
"Fica autorizado o pagamento administrativo de indenização às vítimas do caso Escola Base, em virtude da responsabilidade civil do Estado por atos cometidos por seus agentes".
Para justificar a intenção, o decreto cita os princípios da dignidade
humana e da inviolabilidade da honra e da imagem das pessoas. Ambos
salvaguardados pela Constituição Federal de 1988.
Com a morte de Covas em 2001, mudaram os quadros da
Procuradoria-Geral do Estado e do Palácio dos Bandeirantes. Mudou também
o entendimento do governo estadual e o decreto oficial passou a ser
questionado na Justiça.
Renúncia de prescrição
Em primeira instância, a juíza encarregada acolheu o argumento da
advocacia do estado. Ficou decidido que o decreto apenas significava que
Covas havia mandado verificar se havia débito com alguma vítima do caso
da Escola Base. Entretanto, como a ação havia sido iniciada em 2004,
dez anos após o incidente, a indenização teria prescrito e não poderia
mais ser cobrada.
A defesa de Paula Milhim recorreu ao TJ-SP e obteve ganho de causa
na 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal. A Corte entendeu que a
intenção do decreto emitido por Covas, ainda que não diga
explicitamente, é determinar a interrupção da prescrição.
"É evidente que esse decreto foi uma maneira que o governador encontrou de garantir a todas as vítimas uma recomposição, ainda que parcial, daquilo que foi perdido após o verdadeiro linchamento moral por elas sofrido quando da época dos fatos", justificou o desembargador José Roberto Cabella, relator da ação.
O Tribunal entendeu que o decreto oficial contém uma renúncia, ainda
que tácita, à prescrição. O relator cita também decisões anteriores de
outras Cortes nas quais ficou reconhecido que é legítimo o Poder
Executivo interromper a prescrição de indenizações por força de atos
administrativos.
"Não é de hoje que o governo, em casos emblemáticos, reconhece seus erros e tenta, na medida do possível, repará-los", explicou.
Perspectiva de pagamento
Uma vez reafirmado o direito à indenização, o desafio da defesa de
Paula Milhim passa a ser a efetivação desse direito. "Ela vai viver para
receber?", indaga o advogado Laércio José dos Santos.
Como ainda há (a provável) chance de um recurso da Procuradoria-Geral
do Estado no STJ (Superior Tribunal de Justiça), a decisão do TJ-SP não
é definitiva. Sem a ação ter transitado em julgado, Paula ainda nem
entrou na fila dos precatórios do Tribunal.
O advogado Flávio Brando, presidente da Comissão de Dívida Pública da
OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo), afirma
que a perspectiva de recebimento dos valores devidos pelo governo
paulista é bem pessimista.
"O estado de São Paulo deve aproximadamente R$ 20 bilhões",
diagnostica Brando ao afirmar que somente R$ 2 bilhões já foram
depositados.
O cenário mais otimista para Paula surge se ela conseguir ser
enquadrada na fila dos pagamentos preferenciais. Entretanto, mesmo que
ganhe mais agilidade seriam liberados apenas R$ 54 mil para depósito
nestas condições, o restante só seria quitado após ela seguir
normalmente a fila de pagamentos do Tribunal.
O envolvimento da Globo [aqui]
Um comentário:
meu nome e marina milhin sou filha da dona da escola base se opuder entrar em contato comigo e mail marinamilhin@bol.com.br
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