BAGSHOT,
Grã-Bretanha, 2 Mar (Reuters) - O secretário-geral da Fifa, Jérôme
Valcke, fez na sexta-feira um duro ataque aos preparativos para a Copa
do Mundo de 2014 no Brasil, dizendo que "não há muita coisa se mexendo",
e que os organizadores precisavam levar "um chute no traseiro".
Valcke, um crítico habitual dos preparativos da Copa no
Brasil, disse que o tempo está correndo sem que haja um "plano B"
disponível.
A Fifa disse estar particularmente preocupada com transportes e
alojamento, e também com a demorada tramitação pela burocracia
brasileira de leis relacionadas à venda de álcool nos estádios. Após
vários adiamentos, a Lei Geral da Copa deve ser votada na terça-feira na
Comissão Especial criada para analisar este tema.
O secretário-geral, que está na Inglaterra para a reunião
anual da International Board, entidade que trata das regras do futebol,
disse a jornalistas: "Não entendo por que as coisas não estão avançando.
Os estádios não estão mais no prazo e por que muitas coisas estão
atrasadas? A preocupação é que nada é feito ou preparado para receber
muita gente. Lamento dizer que as coisas não estão funcionando no
Brasil".
"A gente deveria ter recebido documentos assinados em 2007, e
estamos em 2012. Vocês precisam se pressionar, levar um chute no
traseiro e fazer a Copa do Mundo", acrescentou Valcke. Ele disse que a
Copa será mantida no Brasil, mas alertou que os torcedores podem sofrer.
Durante sabatina com jornalistas da Folha de S.Paulo e do UOL,
o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, disse que Brasil e Fifa têm
interesses diferentes em relação ao Mundial.
"A Fifa é uma entidade privada, ela não quer a mesma coisa que
nós da Copa. Eles visam lucro. Eu quero ingresso para indígena assistir
aos jogos em Manaus, quero que pessoas de baixa renda, como as
beneficiadas pelo Bolsa Família, possam participar do evento. Então,
temos que negociar", disse o ministro.
Uma fonte do ministério disse à Reuters que "o ministro se
mostrou incomodado" com as críticas e que "não dá para ficar satisfeito
com este tipo de posicionamento".
Já o diretor de comunicação do comitê organizador local,
Rodrigo Paiva, entendeu que as críticas de Valcke foram mais endereçadas
a questões ligadas ao papel do governo na preparação para o Mundial.
Sobre os estádios, ele comentou que os problemas que existem são
públicos e se concentram nas arenas de Natal e Porto Alegre.
HOTÉIS
"Não há hotéis suficientes", acrescentou o secretário-geral da
Fifa. "Você tem mais do que suficientes em São Paulo e no Rio de
Janeiro, mas se você pensar em Manaus, precisa de mais. Digamos que você
em Salvador tenha Inglaterra x Holanda, e você tenha 12 por cento do
estádio com torcedores ingleses, e 12 por cento holandeses - são 24 por
cento de 60 mil torcedores. Onde todos eles vão ficar? A cidade é
bacana, mas a forma de chegar ao estádio e toda a organização de
transporte precisa ser melhorada."
A Fifa inicialmente queria concentrar cada equipe em uma
determinada região, para minimizar as viagens, mas os organizadores
preferem que os jogos sejam espalhados pelo país. Valcke disse que isso
abre exigências extras.
"Tomamos a decisão de movimentar os times, e isso implicou que
fôssemos criticados. Se você acompanhar um time, terá de voar 8.000
quilômetros. Fizemos isso a pedido do Brasil. Tendo apoiado a decisão,
temos de assegurar que os torcedores e a mídia (...) possam acompanhar o
seu time."
"Nossa preocupação é que nada é feito ou preparado para
receber tanta gente, porque o mundo quer ir ao Brasil. Essa é a grande
diferença entre a África do Sul em 2010 e o Brasil. As pessoas não se
preocupam com a segurança, não se preocupam com o clima é incrível. Na
África do Sul era inverno, estava escuro. No Brasil o clima será
perfeito. Mas posso dizer a vocês, por outro lado, que a organização não
é exatamente assim."
Na sua última viagem ao Brasil, em janeiro, Valcke já havia
pedido pressa na aprovação das leis para a Copa, porém havia elogiado os
estádios. A Fifa manifesta particular preocupação com as restrições
para a venda de álcool e com a meia-entrada para estudantes e idosos.
O ex-atacante e deputado federal Romário (PSB-RJ) disse que
vem defendendo a aprovação da Lei Geral da Copa o mais rápido possível, e
que as críticas da Fifa "não servem para mim e outros pouquíssimos
políticos, e sim para muita gente".
Ele disse que Valcke tem razão em dizer que o Brasil está
atrasado na preparação para a Copa, mas ressaltou que "a Fifa não está
acima da soberania do Brasil".
As preocupações da entidade internacional parecem estar se
agravando. Para Valcke, o Brasil parece mais preocupado em ganhar a Copa
do que em organizar um bom torneio.
"Temos pouco mais de um ano até a Copa das Confederações, e
dois anos antes da Copa do Mundo", disse Valcke. "A prioridade da África
do Sul era organizar a Copa do Mundo, em vez de ganhá-la. Parece que
tudo o que o Brasil quer é ganhá-la, e isso precisa mudar."
Os sul-africanos foram eliminados na primeira fase do Mundial de 2010, torneio vencido pela Espanha.
(Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier no Rio de Janeiro)
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