Sempre que ouço aquela velha retórica revestida de argumentos
técnico-jurídicos sobre as Leis e suas interpretações, lembro-me da
frase do jurista Dalmo Dallari: “A Lei diz o que o Juiz diz que ela
diz”. “Recurso”, “Instância”, “Prescrição”, “Apelação”, “Supremo”,
“Superior”, “Alçada”, “Liminar”, “Cautelar” etc. São tantos os desvios
que a Lei oferece para que a Justiça não alcance aqueles que podem
pagar, que o abismo entre seguir a Lei e fazer Justiça parece
intransponível. Os colarinhos brancos precisam de cobertura. Precisam
legalizar o ilegal ou criminalizar o legal. Aí entra esse emaranhado de
artigos, parágrafos, incisos etc, que permitem enganar a Justiça. Paulo
Maluf é um exemplo clássico. Uma legião de guarda-costas jurídicos o
acompanha pra todo lado. Sua impunidade já virou folclore.
Temos visto aparecerem aqui e ali depoimentos de juristas,
especialistas, analistas, técnicos etc, sobre as inúmeras
irregularidades que envolveram o despejo dos moradores de Pinheirinho,
em S. José dos Campos. Resumindo as dissertações, uns dizem que o sinal
verde dado pela juíza Márcia Loureiro para que os brucutus de Alckmin
atacassem aquela gente, foi ilegal porque na hierarquia de valores, o
direito de um empresário não pode se sobrepor ao direito de 6 mil
pessoas. Principalmente porque os moradores de Pinheirinho foram se
instalando no terreno progressivamente, ao longo de 8 anos (fala-se até
em usucapião!). Outros dizem que o terreno da tal massa falida tem
escritura suspeita, obtida de forma obscura depois da também obscura
morte de seus antigos proprietários. Há, ainda, uma fortuna de IPTU
sobre o terreno a ser paga aos governos Estadual e Federal.
Nesta semana, matéria veiculada pelo jornal O Vale,
mostrou que, depois da destruição do bairro de Pinheirinho, os
escombros receberam novos moradores: dependentes químicos de crack. Pois
é: graças a Alckmin, agora SJC já tem sua própria cracolândia! Outra reportagem
do mesmo jornal, avisava, na semana passada, que o entulho que restou
da destruição das casas e pertences dos moradores transformou-se em
criadouro do mosquito da Dengue. Sendo assim, a ação do governador
extrapolou o descaso com os pobres e agora já atinge a todos os
habitantes de SJC – sem distinção de classe social… Além disso, mesmo
com o silêncio do PiG, alguns jornalistas e voluntários conseguiram
furar o bloqueio imposto pela PM e denunciaram
o terror a que estão sendo submetidas as famílias nos abrigos
improvisados pela prefeitura. Além do relato de um estupro, de um
habitante hospitalizado em coma e de alguns desaparecidos, há ameaças de
morte, agressões gratuitas, crianças traumatizadas, comida estragada,
falta de condições mínimas de higiene, idosos adoentados, falta de
remédios – enfim – todos os problemas decorrentes da expulsão de 6 mil
pessoas de suas casas se concentram naqueles abrigos.
Logo após o massacre, muitos acusaram o governo paulista e sua
oposição de estarem tirando proveito político do drama daquelas
famílias. De um lado, Alckmin, agradando seu eleitorado conservador, que
adora assistir à virilidade com que suas tropas, vestidas com aqueles
uniformes de Rambo, “enfrentam” os “marginais”. De outro, a oposição,
que estaria usando o episódio para demonizar o governador. Pois bem, já
passou da hora dos vídeos, das fotografias e da demagogia. De Alckmin
não se pode esperar mais nada: a idéia do governador é diluir o povo de
Pinheirinho na massa de indigentes espalhados pelo Estado de São Paulo.
Da oposição paulista, só podemos esperar uma coisa: que pressione o
Governo Federal para que adquira o terreno e inicie sua urbanização em
caráter de extrema urgência. Uma vez de posse do terreno, que inicie um
mutirão entre os próprios moradores para a reconstrução das casas – como
um de seus líderes, o “Marrom”, garante que é perfeitamente viável.
Sei que não tão é simples assim. Haveria entraves. Tanto jurídicos,
quanto políticos. O Governo Federal teria que passar por cima da
retórica anêmica do processo da falência da empresa de Naji Nahas.
Também teria que passar por cima da autoridade do prefeito e do
governador… Mas, como trata-se de uma emergência, bastaria boa vontade.
Ora! Se o terreno está avaliado em 180 milhões e está vinculado a um
processo de falência no qual o valor arrecadado com sua venda será
destinado ao pagamento dos credores de Naji Nahas, que o Governo Federal
deposite em juízo essa quantia e tome posse imediata do terreno! Pouco
importa se nos bastidores há acordos verbais com a especulação
imobiliária – que é o verdadeiro motivo de todo este drama.
Afinal, o que impede o Governo Federal de agir? Quem ousaria
negar-lhe o direito de solucionar este caso a favor dessas famílias de
Pinheirinho? Um governo que tem a marca da inclusão social; que tanto já
fez e promete fazer… Um governo que bate recordes de aprovação… Por que
essa paralisia cada vez que tem que enfrentar o PSDB paulista?
Senador Suplicy: antes de identificar e processar os culpados pelo
massacre de Pinheirinho, é urgentíssimo salvar essas famílias. Foi-lhes
roubada a cidadania, seu futuro e o de seus filhos. A situação dessa
gente não fica a dever nada à dos judeus amontoados nos galpões nazistas
a espera de entrarem na linha de produção do extermínio. É essa a
imagem que guardaremos de Pinheirinho?
Um comentário:
Professor, não é bem assim, paga e leva. O dinheiro do governo federal não é do governo, é do contribuinte, assim como o dos governos estaduais e municipios.
Temos que saber se toda população brasileira está de acordo com esse pagamento.
Afinal, são milhões de sem-teto.
Não é?
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