Até as pedras sabem que Vladimir Herzog foi morto sob tortura nas dependências do DOI-Codi de São Paulo
“Eu não aguento mais. A minha paciência chegou ao limite”, desabafou Ivo Herzog,
um dos dois filhos do jornalista Vladimir Herzog – torturado e
assassinado nas dependências do DOI-Codi, em São Paulo, em 1975, ao
relatar uma experiência particular recente, em meio à luta da família
para obter do Estado brasileiro o reconhecimento da responsabilidade
pela morte do pai. Ele contou que uma menina de apenas dez anos, ao ver as imagens forjadas do enforcamento de seu pai pela televisão, não se conteve e exclamou: “Deve ser muito ruim morrer enforcado”.
Esse é um dos motivos pelo qual a viúva e os filhos de Vlado querem
também a retificação do atestado de óbito assinado, na ocasião da morte
do jornalista, pelo legista Harry Shibata. “Foi em cima
desse atestado que eles montaram essa farsa”, disse Ivo Herzog, de 45
anos, que esteve na sede da OAB do Rio de Janeiro e foi recebido em
audiência pelo presidente da Seccional, Wadih Damous.
O laudo do legista que colaborava com a ditadura dá como causa da morte a asfixia mecânica.
A iniciativa do encontro partiu da Seccional, cuja direção manifestou
apoio incondicional à luta da família Herzog pelo reconhecimento da
responsabilidade do Estado brasileiro pela morte do jornalista. Na
opinião de Wadih, já passou da hora de o Estado brasileiro admitir
publicamente que Herzog foi torturado e morto quando estava sob a
custódia do órgão de repressão paulista.
Diante das evidências, a OAB-RJ também ofereceu ao filho do
jornalista apoio jurídico para uma nova tentativa de cumprimento da
sentença proferida pelo juiz federal Márcio José de Moraes, que
determinou, em 1978, a abertura de um Inquérito Policial Militar (IPM)
para apurar as circunstâncias e os responsáveis pela morte de Vladimir
Herzog (cujo nome de batismo era Vlado) e estaria hoje com 75 anos. A
exigência da execução da sentença passou despercebida por todos até
hoje.
“Até as pedras sabem que Vladimir Herzog foi morto sob tortura nas
dependências do DOI-Codi de São Paulo”, disse Wadih, acrescentando que,
por este motivo, o Estado brasileiro precisaria reconhecer o
assassinato. “É muito ruim para a imagem internacional do Brasil que o
país continue a sofrer condenações da Corte Interamericana de Direitos
Humanos por leniência na apuração dos crimes praticados por agentes
públicos à época da ditadura militar”, enfatizou.
A Comissão
Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados
Americanos (OEA) abriu oficialmente investigação sobre o motivo de o
Brasil não ter investigado e punido os responsáveis pelo assassinato sob
tortura do jornalista. O governo brasileiro recebeu, em
março deste ano, a notificação da denúncia. Mas respondeu ao órgão
internacional que não vai reabrir a ação criminal sobre a morte de
Herzog devido à Lei de Anistia. O país deu a mesma justificativa ao ser
questionado em 2010 pelas mortes de participantes da Guerrilha do
Araguaia. A família do jornalista e entidades de direitos humanos vão
contestar a resposta brasileira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário