A jornalista francesa Marie-Monique Robin fez um documentário interessante: Esquadrões da morte: a escola francesa.
De acordo com seu trabalho de garimpagem científica, aprendemos que a
França formou a verdadeira escola de tortura tipo exportação. O terreno
de aprendizagem francesa – ou seja, de cobaias – foram os argelinos
que lutavam pela libertação. Oficiais das três forças armadas
testemunham neste documentário, tecendo uma realidade há tempos
ocultada aos meios de comunicação.
Sabia-se que o filósofo militante Albert Camus havia assumido a causa
da libertação na Argélia e que o pensamento político e filosófico
francês levou muitos decênios para defender a causa argelina. Jean-Paul
Sartre, por exemplo, que não gostava de Camus, preferia reafirmar seu
comunismo ideológico entre quatro paredes, jamais na militância de uma
causa política. Ainda porque a França não queria entregar a Argélia, era
preciso continuar o ciclo da colonização. Mas Camus morreu antes da
libertação argelina. Ha tempos, soubemos da influência americana nos
golpes de Estado de todos os países da América do Sul. Entretanto, Robin
descreve que a experiência e a prática francesas de jogar pessoas de
pés e mãos atados no mar não é invenção dos oficiais argentinos e as
piores crueldades cometidas contra a resistência são um aprendizado made in France.
No país dos direitos humanos, onde Helder Câmara discursou em maio de
1970 denunciando os abusos militares no Brasil, tudo era repassado aos
donos do poder e do medo no Brasil.
Guerra Suja da CIA
Guerra Suja da CIA
Sabe-se, no entanto, que os EUA tinham bases no Panamá com o intuito de
“ideologizar e doutrinar” os militares brasileiros e sul-americanos
contra o perigo comunista. Os experts franceses eram convidados
especiais para ensinar táticas de interrogatório e estiveram no Brasil,
no Chile e na Argentina. O desaparecimento de líderes da oposição foi
inaugurado pelos franceses na batalha da Argélia. A França criou os
esquadrões da morte. Desta forma, os sociólogos franceses Yves Dezalay e
Bryant Garth, no livro La mondialisation des guerres de palais,
confirmam que os EUA tiveram papel importante a partir de 1950 no
Brasil, Chile e Argentina, no interesse de investir na educação
superior. De fato, alguns chilenos foram premiados com vagas nas
melhores universidades americanas e depois ocuparam cargos importantes
na ditadura de Pinochet. O objetivo americano, de acordo com Dezalay e
Garth, era mergulhar nas ajudas filantrópicas, como as fundações
Rockefeller e Ford, geradas no início pela CIA. A Fundação Ford rompe
com a CIA e se torna uma força de oposição.
A inteligência americana derrubava governos em nome do interesse
financeiro e político. O chefe da CIA era sempre o presidente americano.
Por trás desta cortina de aparência cortês estava a guerra-fria. Um
exemplo macabro nos lembra a eleição de Jacobo Arbenz na Guatemala de
1953. O pano de fundo da eleição de Arbenz era a reforma agrária porque
2,2% dos proprietários rurais detinham 70% das terras cultiváveis. A
Guatemala era a maior produtora de banana e frutos tropicais,
pertencentes aos irmãos John Foster Dulles e Allen Dulles. Eles eram
sócios majoritários das ações da United Fruit Company. Mas os brothers
Dulles ocupavam cargos importantes no governo Eisenhower e as terras
monopolizadas por americanos não seriam nacionalizadas. No lugar de
Arbenz, Allen Dulles, então diretor da CIA, colocou uma junta militar na
responsabilidade de um amigo fantoche. A ditadura militar matou na
Guatemala centenas de milhares de camponeses. Alguns anos mais tarde,
Cuba sofreria as mesmas investidas da CIA e Fidel Castro teria escapado
de mais de vinte tentativas de assassinato.
Imprensa engessada
Imprensa engessada
Não é de hoje a história do controle dos meios de comunicação. A revista Time não deu nenhum crédito sobre a responsabilidade americana no complô da Guatemala. Já o New York Times
foi menos cínico, de acordo com William Blum, e deixou correr os
rumores de golpe indicando que aquilo não fora uma reunião sindical de
líderes comunistas. Hoje, a imprensa pena para encontrar as razões da
existência dos talibãs no Afeganistão. O mundo pira com a ideologia do
bem e do mal, mas segundo os ex-diretores da CIA tudo aquilo é obra da
inteligência americana. A contraespionagem da CIA criou os grupos de
resistência afegã contra a invasão russa de 1979, armou os rebeldes da
mesma forma como fez a CIA de Ronald Reagan com os contras da Nicarágua.
O resultado pró-americano é que Osama bin Laden foi cooptado para ser
espião ao lado do bem nos EUA, desertou e dizem que destruiu as duas
torres gêmeas. O que aqui escrevi é apenas uma pincelada da história em
que a tão potente imprensa ficou engessada dos pés à cabeça. Os
oficiais franceses da batalha da Argélia não permitiram que se
guardassem arquivos e um dos únicos resquícios desse período é o filme
ítalo-argelino boicotado pelos meios de difusão cinematográfica.
Mario Doraci Pinheiro é jornalista, radicado na França, mestre em Sociologia da Comunicação
Fonte: Observatório da Imprensa
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