E reaparece meu pai, Giannino, e não diz “profetica anima mea”, alma minha profética. Confirma apenas “mala tempora currunt”
e comenta como é elementar a tarefa do analista político nas nossas
latitudes. Refere-se, está claro, ao jornalista honesto, habilitado a
perceber a previsibilidade dos movimentos dos senhores da casa-grande.
Até o mundo mineral recorda os tempos precedentes ao golpe de 1964 e
reencontra aquele tom de fúria nos jornalões dos últimos dias.
Desfraldam manchetes dignas da eclosão da guerra atômica. Está em curso,
de fato, uma operação na mira de 2014, articulada em duas frentes com o
mesmo objetivo: a debacle final de quem ousasse preocupar-se com o
destino do País todo, senzala incluída.
Em uma frente visa-se Lula, sua popularidade e seu
peso em relação ao futuro da presidenta Dilma. Ocorre assim que venham à
tona detalhes do depoimento prestado há três meses por Marcos Valério à
Procuradoria-Geral da República. Vazados por quem? Pelo próprio Roberto
Gurgel em busca de desforra? Há figuras ilustres engajadas na campanha,
imponente entre elas o novo presidente do STF, Joaquim Barbosa, o qual
se apressa a declarar que o ex-presidente pode ser investigado pelo
Ministério Público. Ao lado do nosso Catão postam-se prontamente (e quem
mais?) os ministros Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello. Mendes é
aquele, para quem esqueceu, que chamou às falas o então presidente Lula,
pediu e ganhou a cabeça do delegado Paulo Lacerda, acusou a Abin de um
grampo inexistente e trabalhou com êxito para o enterro da Operação
Satiagraha e a felicidade de Daniel Dantas. Quanto a Mello, dispensa
apresentação no seu inesgotável papel de homem-show.
Não falta um colaborador de elevada qualificação, o feliz
contraventor Carlinhos Cachoeira, parceiro de Policarpo Jr., impagável
representante da Veja em várias operações criminosas. Quem sabe
a dupla se consolide no momento em que Cachoeira realizar sua ameaça:
“Sou o garganta profunda do PT”. O que espanta, nisso tudo, é a falta de
reação à altura por parte do partido. Parece estabelecida uma corrente
de pusilanimidade entre Odair Cunha e a presidência do PT, dotada de uma
vocação cristã alçada à enésima potência: não lhe basta oferecer a
outra face, imola-se por inteiro.
E que dizer do desempenho do ministro da Justiça, José Eduardo
Cardozo? Imerso em perfeito silêncio diante de acontecimentos que dizem
respeito à sua pasta. Quando fala manifesta, não sem altaneira timidez,
sua impressão (ou seria sensação?) de que Lula é inocente. Consta que
este ministro tem amigos graúdos e costas quentes. Outro, digníssima
figura merecedora do apoio de CartaCapital, é o alvejado Guido
Mantega, em boa parte executor da política econômica do governo. Se
atiram nele, sejamos claros, é porque querem atirar na presidenta.
Eis aí a segunda frente da Operação 2014. A política
econômica do governo enfrenta e desafia interesses poderosos. É
antídoto salutar à religião do deus mercado que infelicitou e infelicita
o mundo, mexe mais ou menos profundamente com o setor elétrico, reduz
os juros e o spread. Atinge bancos e indústria, fecha a porta
para os ganhos extraordinários na renda, até ontem tão compensadores dos
resultados medíocres na produção. Além fronteiras, cria alvoroço entre
os fundos acostumados ao ganho abundante na terra brasilis.
Há quem diga que teria sido da conveniência do governo coordenar sua
ação entre os envolvidos, negociar com o empresariado, cativá-lo. A
quais empresários alude? Aos que financiam o Instituto Millenium, ou,
pelo menos aprovam sua presença? Aos que devoram as páginas dos
jornalões e se deslumbram com seus candentes editoriais? Missão
complexa, se não impossível, para o coordenador. Explica-se desta
maneira a estulta, penosa tentativa de ver fritado o ministro Mantega
para, ao cabo, criar dificuldades para a presidenta, quem sabe
insanáveis, na expectativa malposta.
Avulta, nisso tudo, a diferença dos tempos. Entre aquele das diatribes golpistas de quase 50 anos atrás e as de hoje. CartaCapital
permite-se um aprazível momento de otimismo. O que mudou é o povo
brasileiro, a maioria da nação. Esta não está nem aí, como se diz.
Talvez nunca tenha sido capaz de dar ouvido às ordens da casa-grande,
executou-as, porém, passiva e automaticamente, negada à compreensão do
seu significado. Agora não lhe ouve os apelos porque fez a sua escolha, e
não é a favor dos senhores e dos seus capatazes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário