Manifesto online de 51 especialistas em estudos sobre o Brasil em universidades estrangeiras aponta que a democracia brasileira encontra-se "seriamente ameaçada"; documento reconhece a necessidade do combate à corrupção, mas diz que "setores do judiciário, com o apoio da grande imprensa, têm se tornado protagonistas em prejudicar o Estado de Direito"; para os acadêmicos, a retórica contra a corrupção pode estar sendo usada para desestabilizar um governo democraticamente eleito, como ocorreu com o ex-presidente João Goulart (1964); documento é idealizado pelo historiador James Green, da Universidade Brown (EUA), e já recebeu mais de 1.000 subscrições até esta manhã, entre elas de Barbara Weinstein, da Universidade de Nova York, de Elizabeth Leeds, do Massachussets Institute of Technology – MIT, além de estudiosos da França, México, Argentina, África do Sul, Índia e Japão
Um manifesto online, assinado por 51 acadêmicos especializados em
estudos sobre o Brasil em universidades estrangeiras, diz que a
democracia brasileira encontra-se "seriamente ameaçada" pelo atual clima
político. O documento, que convoca intelectuais estrangeiros a aderirem
ao texto, já recebeu mais de mil subscrições até a manhã de hoje (28),
desde que foi lançado, há quatro dias.
Idealizado pelo historiador James Green, da Universidade Brown, em
Rhode Island, nos Estados Unidos, e o sociólogo brasileiro Renan
Quinalha, pesquisador convidado na Brown, o manifesto reconhece a
legitimidade e a necessidade do combate à corrupção por meio de
inquéritos como os da Operação Lava Jato, mas acusa o que seriam abusos
na condução da investigação e afirma que "setores do judiciário, com o
apoio de interesses da grande imprensa, têm se tornado protagonistas em
prejudicar o Estado de Direito".
"Tomamos a iniciativa de organizar esse abaixo-assinado por conta da
grave situação política que o Brasil atravessa hoje. Recebemos uma
chamada de acadêmicos brasileiros pedindo solidariedade na defesa da
democracia e atendemos prontamente a esse chamado", disse Green, por
email, à Agência Brasil. "Nossa intenção foi somar a comunidade
acadêmica internacional às diversas iniciativas que estão se
proliferando pelo Brasil."
Green é autor dos livros Além do Carnaval – A Homossexualidade
Masculina no Brasil do Séc. XX (Unesp, 2000) e Apesar de Vocês –
Oposição à Ditadura Brasileira nos Estados Unidos, 1964-1985 (Companhia
das Letras, 2009), que analisa as relações Brasil-EUA no período e conta
a história de pessoas que combateram o regime militar brasileiro a
partir do país norte-americano.
O texto é assinado, entre outros, por brasilianistas como Barbara
Weinstein (New York University), autora de diversos livros sobre o
Brasil pós-colonial; Elizabeth Leeds (Massachussets Institute of
Technology – MIT), que é também cofundadora e presidente de honra do
Fórum Brasileiro de Segurança Pública; e Jean Hébrard, professor na
Ecóle de Hautes Études en Sciences Sociales, em Paris. Assinam ainda
intelectuais brasileiros que no momento atuam fora do país, como o
especialista em literatura brasileira Pedro Meira Monteiro, que leciona
na Universidade Princeton, em Nova Jersey, nos Estados Unidos, e o
historiador Sidney Chalhoub, professor convidado na Universidade
Harvard, em Massachussets (EUA).
Impeachment
No manifesto, os acadêmicos enxergam um sério risco de que a retórica
contra a corrupção esteja sendo usada para desestabilizar um governo
democraticamente eleito, citando que o mesmo expediente fora utilizado
antes da queda do ex-presidente João Goulart (1964), dando espaço à
ditadura militar subsequente. À Agência Brasil, Barbara Weinstein
criticou o processo de impeachment em curso no Congresso.
"Caso surjam evidências de algo mais sério do que 'contabilidade
criativa', ou se você puder encontrar uma maioria de dois terços da
Câmara dos Deputados que se acredite nunca ter cometido qualquer ato que
possa ser descrito como 'corrupto' ou 'desonesto', então talvez eu
possa considerar legítimo que eles decidam se Dilma permanece no cargo
ou é impedida", disse Weinstein. "Acho muito improvável."
Para Chalhoub, um dos historiadores brasileiros de maior projeção
internacional, "o processo de impeachment tem bases muito frágeis, como
já mostraram vários juristas. E está sendo conduzido por parlamentares
sobre os quais pesam acusações de gravidade ímpar. Destituir uma
presidenta desse modo fragiliza a democracia, é um golpe contra ela,
traduz apenas o inconformismo dos derrotados nas eleições de 2014. Esse é
um momento decisivo da democracia brasileira", disse ele à Agência
Brasil.
Dos mais de mil subscritos no abaixo-assinado disponível no site
Avaaz, grande parte é composta por acadêmicos do México e da Argentina,
mas há intelectuais de países diversos, como África do Sul, Índia, Japão
e Turquia.
No Brasil 247
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