terça-feira, 19 de abril de 2016

The Guardian diz que impeachment é uma tragédia e um escândalo

Apoiadores da presidente Dilma Rousseff reunidos em frente ao Congresso Nacional, em Brasília, no domingo. Fotografia: Beto Barata/AFP/Getty Images

Desde que Stefan Zweig escreveu, em 1941, chamando o Brasil de “a terra do futuro”, o país vem sendo repreendido por falhar em atender às expectativas que o seu tamanho, recursos e isolamento de guerras e problemas que afetam outras partes do mundo parecem criar. Houve momentos em que essa promessa pareceu estar à beira de se tornar realidade, mas tais esperanças foram novamente, repetidamente, desfeitas. O mais recente veio com a ascensão ao poder do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003. Lula e o seu Partido dos Trabalhadores (PT) trouxeram novas ideias, nova energia e um novo estilo para a política brasileira, desfigurada pela corrupção, pelo paternalismo e por uma persistente procrastinação diante dos problemas urgentes da nação.

O PT era um partido real, com uma base massificada por todo o país, uma ideologia coerente e, aparentemente, um forte senso moral - características que faltavam em outras agremiações partidárias. As políticas sociais de Lula trouxeram para e ele e para o PT uma imensa popularidade, garantiram a reeleição para um segundo mandato e ajudaram sua sucessora, Dilma Rousseff, a conquistar as vitórias de 2010 e 2014. Desde então, a história foi ficando mais sombria até que atingiu o seu ponto menos iluminado no domingo, quando a Casa menor do Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados, votou pelo seu impedimento. E ainda pode piorar, porque o impeachment, longe de ser a solução para a polarização política e social do Brasil, já agravou esse cenário.

A parede de metal erguida ao longo da Esplanada (uma área de parques no centro de Brasília) para prevenir manifestantes favoráveis e contrários à presidente de se engajarem em confrontos físicos durante a votação do impeachment é simbólica de quanto a polarização já foi longe demais. O historiador José Murilo de Carvalho disse recentemente que a radicalização e a intolerância no país chegaram a um ponto muito perigoso.

Como as coisas deram tão errado? A resposta pode ser encontrada nas mudanças da economia global, na personalidade da presidente, no abraço do PT a um sistema corrupto de financiamento partidário, no escândalo que explodiu quando esse sistema foi exposto e no relacionamento disfuncional entre os poderes Executivo e Legislativo do Brasil. A economia entrou em um declínio quando os preços das commodities, que são as principais exportações do país, caíram vertiginosamente. O crescimento diminuiu, depois parou, e enfim se reverteu; os empregos se tornaram mais escassos; os preços subiram e os programas sociais introduzidos por Lula se tornaram mais difíceis de financiar. O próprio PT, outrora o partido menos corrupto do país, escolheu resolver seus problemas financeiros mergulhando em um pote de dinheiro desviado da Petrobras, a empresa nacional de petróleo. A coalizão, os aliados e outros partidos se juntaram a eles.

Finalmente, a Constituição brasileira - que coloca no mesmo governo uma presidente eleita popularmente e membros de um Congresso eleitos em lista aberta, por representação proporcional - é uma receita para conflito na maioria das vezes. Como resultado, um líder teoricamente poderoso é confrontado por uma força de partidos que ele ou ela precisa cortejar com cargos, ministérios e compromissos políticos se quiser montar uma base no Congresso. A consequência, geralmente, é que o executivo chefe já perde metade do seu espaço de manobra antes mesmo de começar a tentar governar. Lula era um mestre em gerenciar essas contradições. A presidente Dilma, ineficiente e inconsistente, não tem a mesma habilidade.

Quando o Ministério Público e a Polícia Federal começaram a investigar o caso da Petrobras, e quando depois o juiz Sergio Moro assumiu, eles não previram os danos que essas revelações causariam? Provavelmente não. A intenção parece ter sido de purificar a política brasileira, tomando como precedente as investigações da Operação Mãos Limpas, na Itália, nos anos 90.

Mas o desfecho real é o oposto e é um paradoxo. A presidente não foi implicada no escândalo da Petrobras. As bases para o seu impeachment são de que ela manipulou dados financeiros antes das últimas eleições - o que não representa muito mais do que uma delinquência menor pelos padrões brasileiros. No entanto, quase todos os que estão envolvidos no seu impeachment são suspeitos de corrupção, incluindo Eduardo Cunha, o presidente da Câmara dos Deputados.

Agora, muitos temem que a campanha anticorrupção vá desaparecer, com exceção de um esforço final de concentrar fogo em Lula. Michel Temer, o vice-presidente, vai enfrentar os mesmos problemas da derrotada Dilma Rousseff, e suas chances de lidar com eles de forma eficiente precisam ser classificadas como baixas. Uma oposição desacreditada vai assumir o lugar de um PT desacreditado. É difícil vislumbrar mais do que um panorama sombrio para o Brasil.

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