domingo, 20 de setembro de 2009

O Apanhador de Desperdícios - Manoel de Barros



Manoel de Barros

Esse mundo é vasto, tão vasto que não me comporta. Eis que descubro a maestria de dizer o não-dito em Manoel de Barros.





O apanhador de desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato
de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios.

BARROS, Manoel de. O apanhador de desperdícios. In. PINTO, Manuel da Costa.
Antologia comentada da poesia brasileira do século 21.
São Paulo: Publifolha, 2006. p. 73-74.


Um comentário:

lula eurico disse...

Já conhecia o Manoel, a quem admiro, mas fico feliz por ter a Poesia contagiado o Terra Brasilis. rsrsrs Isso é sinal de que o Poeta caosagonico, regedor deste blogue, está atento ao mundo, vasto mundo, da "invencionática."

Abraçamigo fraterno.

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