sábado, 15 de maio de 2010

A INDÚSTRIA DA FÉ

Por Gauss M. Cordeiro*

Não sou uma pessoa religiosa no sentido amplo da palavra, mas acredito em Deus como um Ser Supremo. Entendo que o fenômeno da proliferação de todos os tipos de seitas no Brasil tem uma explicação lógica decorrente da situação miserável e medonha em que se encontra grande parte da nossa população: analfabetismo, alimentação insuficiente, saúde precária, educação zero, falta de emprego e moradia, insegurança e grande criminalidade. No interior do Brasil, os templos se multiplicam como as farmácias, constituindo-se numa verdadeira indústria da fé.

Enquanto isso, não se investe o suficiente na educação dos jovens humildes. Assim, as pessoas mais pobres têm dois caminhos: procurar essas seitas que dizem curar todos os males deste mundo e ainda prometem o paraíso numa vida futura, ou então, vão para a marginalidade para poder sobreviver. Desse modo, as seitas são alienantes, pois exploram o sentimentalismo e a ingenuidade das pessoas, tornando-as passivas sem ânimo de lutar pelos seus direitos básicos e fundamentais: saúde, alimentação e educação. Além de contribuírem para aumentar a mão de obra ociosa do País. Os políticos fisiológicos agradecem!

Lamentável que as autoridades públicas que se preocupam com censuras às artes, cinema, teatro e letras de canções, permitem a proliferação dessas seitas fanáticas que funcionam como verdadeiras máquinas caça-níqueis. Não terão sido elas uma das causas do fracasso do Mobral?

A média anual de arrecadação da Igreja Universal do Bispo Edir Macedo, entre março de 2001 e março de 2008, foi cerca de R$ 1 bilhão, segundo dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras do Ministério da Fazenda. Essa Igreja arrecada por ano entre 14% e 20% da produção anual de bens e serviços de cidades brasileiras como Joinville (SC), Maceió (AL), Cabo Frio, Volta Redonda e Niterói (RJ), Natal (RN), Ribeirão Preto, Santos e Diadema (SP), todas colocadas entre as 35ª e 50ª posições no ranking das mais ricas. Façamos outras duas comparações: a Chesf - que abastece com energia 45% do Nordeste -, lucrou em 2008 apenas 40% a mais que a Universal (R$ 1,4 bilhão), e a receita da Prefeitura do Recife com o IPTU em 2009 foi cerca de 20% da arrecadação anual da mesma igreja.

Em João 8:32, lê-se: "A verdade vos libertará". Logo, a mentira nos escravizará. Para mim, muitas dessas seitas são mentirosas e se constituem num grande flagelo que assola o Brasil. A verdade deve ser encontrada no trabalho incessante, no estudo, na educação e na ciência, pois esta é uma busca constante à procura do verdadeiro. A fé cristã, que deve ser respeitada, é algo muito mais importante do que o que se prega na maioria dessas seitas.

Finalmente, eis o paradoxo: o Brasil é o país do mundo ocidental que tem o maior índice de religiosidade e o maior índice de criminalidade.

*Gauss M. Cordeiro, Ph.D em estatística, é professor da UFRPE e UFPE

Fonte: Jornal do Commercio, 11/05/2010

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