Prof. Diógenes Afonso*
Di vorta à polêmica sobre a adoção, pelo MEC, do Livro Por uma vida melhor [Coleção Viver, Aprender].
Há pontos a serem discutidos nessa celeuma toda que fogem ao meramente linguístico. Pode-se, por um lado, perguntar por qual razão a coluna Poder Online resolveu publicar, nove horas depois, matéria em que uma das autoras do citado livro faz a defesa de sua obra. Pode-se, ainda, indagar que tipo de jornalismo é esse que primeiro publica, causa danos com um título inapropriado e incoerente com o próprio corpo da matéria e só depois dá ouvidos a quem foi lançado no olho do furacão de forma injusta. Teria Thaís Arbex faltado com o zelo jornalístico? Teria Thaís, ao titular a matéria, demonstrado pouca habilidade com a adequação vocabular [isso, sim, um dos problemas sérios na produção textual, muito mais do que qualquer "desvio" de concordância verbal]? Ou a jornalista teria usado de má-fé ao fazer o "chamamento" de um matéria que informa, de um modo geral, o contrário do que expõe o título? Aqui não se emite nenhum juízo de valor, embora ele esteja contido em cada indagação. Cabe, apenas, refletir sobre o que se indagou.
Mas vamos à segunda matéria [publicada no mesmo dia 12/05/2011, às 16:08 - aqui] assinada, agora, por uma outra jornalista, Naiara Leão.
O conteúdo publicado dá voz a uma das autoras, e o que se lê é um balde de água gelada no título da matéria de Thaís Arbex [Livro do MEC ensina aluna a falar errado].
O conteúdo publicado dá voz a uma das autoras, e o que se lê é um balde de água gelada no título da matéria de Thaís Arbex [Livro do MEC ensina aluna a falar errado].
Com efeito, Heloísa Ramos [uma das autoras da obra] deixa claro que não pretende promover o ensino das ditas "formas erradas" de expressão e comunicação em língua portuguesa [como contraponto às ditas "formas cultas ou padrões"], mas validar o uso daquelas expressões em contextos de pouca formalidade linguística [aqui me refiro ao que preconiza a norma padrão]:
“Não queremos ensinar errado [Para manter a coerência com a proposta que ela mesma apresenta em um trecho do livro, creio que a professora Heloísa Ramos deveria ter dito: "Não queremos ensinar de forma diversa da norma dita padrão". Usar o termo "errado" apenas abre, por um lado, o fosso em que o "errado" desaba sem piedade e, por outro, contradiz o que a linguística trata como "certo" e "errado" a partir de concretas situações de comunicação - grifo meu], mas deixar claro que cada linguagem é adequada para uma situação. Por exemplo, na hora de estar com os colegas, o estudante fala como prefere, mas quando vai fazer uma apresentação, ele precisa falar com mais formalidade. Só que esse domínio não se dá do dia para a noite, então a escola tem que ter currículo que ensine de forma gradual” [Heloísa Ramos].
Em outro trecho da matéria, é possivel notar que não há intenção de ensinar o aluno a falar errado, como sugeriu Thaís Arbex [primeira matéria sobre o assunto], mas construir ambiências interacionais em que o aluno se sinta contemplado em sua genuína manifestação linguística e, a partir do contato com a outra forma de "dizer" [normatizada pela linguagem dita padrão], perceber que existem formas de comunicação e expressão para contextos diversos. A linguagem socialmente privilegiada deverá ser usada em um determinado contexto, assim como as outras variantes devam ter vida em seus respectivos contextos:
"Ela [Heloísa Ramos] acredita que, ao deixar claro que é tolerada [sic] todo tipo de linguagem, a escola contribui para a socialização e melhor aprendizado do estudante. 'Quem está fora da escola há muito tempo, é quieto, calado e tem medo de falar errado. Então colocamos essa passagem para que ele possa sair da escola com competência ampliada'".
Ademais, não podemos nos esquecer de que os estudos linguísticos, no que concerne ao enfoque dado às variantes linguísticas, pretendem "mostrar" que "O falante deve ser poliglota em sua própria língua", conforme Evanildo Bechara [Se desejar, leia interessante artigo sobre Multiculturalismo e o Ensino de Língua Portuguesa, aqui].
Atire a primeira pedra quem, desses puristas da língua, não se "desvia" da norma dita padrão!... Cantarão eles "Quando chego a casa, nada me consola"? ou preferirá muito mais seguir a regência "não autorizada" [como Caetano Veloso assim procedeu: "Quando chego em casa, nada me consola"] do que o que dita a norma padrão?
Pretendia discutir, também, a posição da linguista Juliana Dias cujo argumento de autoridade é apresentado na matéria. Embora respeite sua forma de ver o ensino da língua [e parece-me que isso deva se estender, para ela, a todas as línguas], assustei-me tanto com o que foi dito que fiquei a me perguntar o que danado ela andou estudando para ser tão inflexível!
Bom, prefiro defender o que diz a doutora e professora da UnB, Viviane Ramalho - invocada também como argumento de autoridade na matéria:
* Graduado em Letras, especialista em linguagem e articulista do Brasil Escola.
Pretendia discutir, também, a posição da linguista Juliana Dias cujo argumento de autoridade é apresentado na matéria. Embora respeite sua forma de ver o ensino da língua [e parece-me que isso deva se estender, para ela, a todas as línguas], assustei-me tanto com o que foi dito que fiquei a me perguntar o que danado ela andou estudando para ser tão inflexível!
Bom, prefiro defender o que diz a doutora e professora da UnB, Viviane Ramalho - invocada também como argumento de autoridade na matéria:
"O ideal seria aprender todas as possibilidades diferentes até mesmo para respeitar o interlocutor que usa outra variedade linguística".
* Graduado em Letras, especialista em linguagem e articulista do Brasil Escola.
Nenhum comentário:
Postar um comentário