sexta-feira, 5 de agosto de 2011

[Deu no NYT] dois gênios de encontram: Rafinha Bastos e Larry Rohter

Ele depõe hoje ao Ministério Público

Rafinha Bastos deve estar orgulhoso (sua assessoria de imprensa provavelmente está trabalhando dobrado)! Esta semana ele apareceu num ensaio fotográfico na revista feminina Lola (odeio muito tudo isso), em que, óbvio, não se faz uma única menção a ele ter sido chamado para depor ao Ministério Público, em SP — aliás, é hoje que ele depõe. Como ainda tem gente que não conhece a piada que ele fez em maio nos seus shows de stand up comedy, repito-a aqui: “Toda mulher que eu vejo na rua reclamando que foi estuprada é feia pra caralho. Tá reclamando do quê? Deveria dar graças a Deus. Isso pra você não foi um crime, e sim uma oportunidade. Homem que fez isso não merece cadeia, merece um abraço”, conforme saiu na Rolling Stone.

Ontem ele saiu, glória das glórias, no New York Times. A reportagem é ― vou tentar ser delicada ― uma porcaria sem fim. Pura puxação de saco, parece matéria paga. Foi uma leitora que me informou do artigo, e junto me mandou o email que enviou ao jornal. Reproduzo-o aqui, sem traduzi-lo: 

Dear Sir/ Madam

My name is Marilia Chaves and I'm a Brazilian publisher, I'd like to apologize in advance for eventual spelling mistakes once English is my second language.

This morning I looked at your NY Times Global Edition homepage and got quite outraged with what I saw. There was an article featuring Mr. Rafinha Bastos, a Brazilian "comedian", if you can call him that. Mr. Bastos is publicly known in my country for making all sorts of offensive jokes against women and minorities in general. He recently gave an interview for the Brazilian edition of the Rolling Stone magazine making rape jokes. Rape jokes that he also performs in his theater presentations. To Rolling Stone he said that "a man that rapes an ugly woman doesn't deserve to go to jail, he deserves a hug", and it's very interesting that your article doesn't even mention this particular characteristic of our "internet star" that is now being sued by the Brazilian government for his public incentive of violence against women.

As a worker for the Brazilian communication system I see everyday that most of my colleagues try to fight against verbal violence and hate, and not award it with a 4-page article about Mr. Bastos and his amazing success as if he's some kind of a genius.

And finally I'd like to say that, from publisher to publisher, I would never have the courage to feature in my product a man that publicly laughs at violence against women.

I hope your next articles get to be better researched and presented, and as a woman I sincerely expect that the NY Times apologizes to all women.

Thank you for your attention.

Muito boa a iniciativa da Marilia. Vamos encher o NYT de emails. Parece que o jornal pensa que estupro é um bom tema pra piadas ou matérias revoltantes (no ano passado foi publicada uma reportagem sobre uma menina de 11 estuprada por dezoito jovens. A preocupação do repórter era com o futuro dos rapazes e da cidadezinha texana. O jornal recebeu tantos protestos que teve que se retratar).


Este artigo de ontem sobre Rafinha é de uma ignorância a toda prova. Primeiro que mostra que quem a escreveu não tem a menor ideia como o nome de Mr. Bastos, como o comediante é chamado em toda a reportagem, se pronuncia. Na primeira citação, aparece uma transcrição fonética pra americano ver: Mr. Bastos (BAH-stows). Opa, sério? É assim que falamos, Bastous? Vivendo e aprendendo, hein?

Há também uma frase preconceituosa pra explicar por que Mr. Bastous é tão popular: “Living in a society that tends toward the chaotic, Brazilians have always had an appreciation for the absurd” (“Vivendo numa sociedade que tende para o caótico, os brasileiros sempre tiveram apreço pelo absurdo”). Não creio que vivemos no caos, a menos que o jornalista esteja falando dos macacos nos cipós que cruzam a Av. Paulista (visão que muitos americanos têm do Brasil: a floresta amazônica cobre todo o país), nem que sejamos tão fãs do absurdo. Caótico, pra mim, é um país gastar trilhões de dólares em guerras e não providenciar atendimento médico aos seus próprios habitantes.

Há um único parágrafo na matéria que menciona, de leve, a sarna que Mr. Bastous escolheu pra se coçar (minha tradução, péssima): “Quando perguntado sobre sua escolha como o tuiteiro mais influente, Mr. Bastous levou na esportiva: 'É lógico que é natural [sic] que estou sendo reconhecido como gênio'. Mas, ficando sério, ele também tem esperança que o reconhecimento lhe dará alguma proteção de uma onda de processos que enfrenta, muitos dos quais aparentam ser, pelos critérios americanos pelo menos, fúteis. Em um caso governantes de um estado amazônico o processam porque ele descreve os habitantes como horrorosos no seu show e DVD. Mais seriamente, promotores recentemente questionaram Mr. Bastous sobre uma piada sua reconhecidamente ofensiva sobre vítimas de estupro”. Ué, quem reconheceu que a piada é ofensiva? Rafa? O jornalista?

Descobrimos na entrevista que Mr. Bastous acha que o que faz na TV é o mesmo que o Jon Stewart. Igualzinho! Por isso, ele quer fazer stand up lá nos EUA. Só posso dizer: vai, Rafinha, vai! Por favor! E leva contigo a trupe do CQC inteira!

Seu único impedimento parece ser o inglês. Daí ele pergunta ao repórter: “Does my English stink?” (“meu inglês é ruim?”). Eta complexo de viralatinha! Observe como o famoso humorista é tão inseguro que precisa da aprovação de um jornalista medíocre.


Pois é, medíocre. Juro que foi só final do artigo que decidi voltar ao começo pra ver quem assinava aquela joça. E qual não foi minha surpresa? É o Larry Rohter! Os mais jovens talvez não saibam, mas em maio de 2004 este correspondente do NYT no Brasil escreveu uma bobagem espetacular, inventando que os brasileiros estavam preocupados com o suposto alcoolismo de Lula (porque, veja só, o presidente foi ao Oktoberfest e tomou chope!). Lula reagiu mal ao episódio: em vez de ignorar a asneira publicada, ameaçou processar Larry e expulsá-lo do país. Deu uma repercussão muito maior que o correspondente merecia.


Pelo jeito, Larry não muda nunca. Ele continua sabendo tanto do Brasil quanto em 2004. Um sujeito que viveu aqui e não tem noção de como pronunciar um dos sobrenomes brasileiros mais comuns. Ele e Mr. Bastous se merecem.

P.S.: A petição que organizei, “Diga a Rafinha Bastos que sexo e estupro são diferentes e que estuprador merece cadeia”, alcançou 1500 assinaturas, que eu considero um bom número. E agora, pra quem que eu mando essas assinaturas? Pro Mr. Bastous, pro NYT, pro CQC? Quem mais? Não tenho experiência nisso!

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