Ontem, dia 24 – ao noticiar a vitória esmagadora de Cristina
Kirschner – o JN repercutiu a direita argentina e seu PiG afirmando que,
com a conquista da maioria no Senado e na Câmara, a presidente terá
poderes de rainha. “Cresce o temor de que ela reduza mais ainda a
liberdade de imprensa ou até cale a imprensa de vez”.
Quer dizer que, quando um governo dá certo, quando a economia vai
bem, quando o “feel good” da maioria se manifesta nas urnas – significa
que NÃO há liberdade de imprensa? Liberdade de imprensa é golpe de
estado e governo militar? Liberdade de imprensa é inflação? Desemprego?
Recessão? Liberdade de imprensa é o modelo neoliberal que levou EUA e
Europa à bancarrota?
Os argentinos não esquecem fácil. Na mesma época em que o Brasil
sofria nas mãos de FHC, os argentinos passavam fome. Aqui e lá,
trabalhadores qualificados, de nível superior, faziam filas enormes para
vagas de qualquer coisa. Lembro bem de um episódio ocorrido no Rio. A
prefeitura havia aberto algo como 200 vagas para gari. Formou-se uma
fila gigantesca, que dava voltas em quarteirões. As pessoas acamparam
como se fossem a um show de rock… A situação era tão bizarra, que a
Globo foi lá e entrevistou as pessoas da fila. Tinha de tudo.
Comerciante, advogado, médico, engenheiro, professor… e – como dizia o
professor Raimundo – o salário era “ó”…
Dá vontade de rir, vendo Bonner com aquele olhar de bom menino dando o
recado subliminar da Globo: respeitar a constituição, que proíbe
cartel, monopólio, propriedade cruzada etc, é CENSURA!
A Globo pode comprar o futebol e determinar ao torcedor o horário do
jogo que lhe convier. Mesmo que isso signifique chegar em casa de
madrugada em plena quarta feira. O PiG pode destruir a carreira de quem
lhe der na telha. Quem não gostar que entre na justiça. Como foi o caso
de Nelson Luiz Conegundes de Souza,
que perdeu o emprego, foi achincalhado pelos colegas de trabalho e caiu
em desgraça por causa de uma reporcagem mentirosa da Folha. Levou 13
anos – 13 ANOS!!! – para que se fizesse justiça e o jornal finalmente
fosse obrigado a se retratar!
A situação do PiG argentino é curiosa. Especialmente a do grupo Clarín, a Globo deles. Não há um pingo de censura, e sim, o total desprezo de Kirschner por eles. Não existe cordialidade ou relacionamento de aparências. É muito claro: a presidente não fala com o PiG. Não dá entrevista. É radical neste ponto. Sua campanha foi feita sem debates nos estúdios das emissoras de rádio ou TV. Sem jornais e revistas dando apoio. E venceu de forma arrasadora.
Na Argentina, é o PiG que rasteja atrás da presidente Kirschner para transmitir cerimônias oficiais, eventos diversos com a presença de ministros, governadores, prefeitos e diversas personalidades. São como paparazzi buscando uma imagem, um áudio, qualquer coisa que possa lhes render audiência e até algum sentido para sua existência.
Quando o governo precisa falar com a população, manda o vídeo de sua mensagem para ser exibido em rede com data e hora marcadas. Se um jornal ou revista publicar mentiras, calúnias etc, sem provas, é obrigado a se retratar no dia seguinte. Não há esquema de recurso, recurso do recurso, instância superior, supremo, desvios e lentidão burocrática. De resto, são livres para apresentar a programação ou publicar o que bem entenderem. O público que use o controle remoto e compre ou não suas publicações.
Com ampliação do número de veículos de mídia, sua diversidade e o crescimento da Internet, os velhos oligopólios midiáticos estão em franca decadência. Porque não sabem fazer o trabalho deles sem manipular e mentir – como nos “bons tempos” da ditadura militar do general Videla.
A regulamentação da mídia argentina – a chamada Ley de Médios – NÃO foi uma imposição. Foi um processo transparente – introduzido depois de ampla discussão com a sociedade e aprovado pelo senado e pelo povo argentino. É baseado em modelos americanos e europeus. Aliás todos os países desenvolvidos e verdadeiramente democráticos tem a sua Lei dos Médios. Só o Brasil ainda permite que 4 famílias controlem tudo o que você vê e lê há um século. Isso quer dizer que seus pais e seus avós também leram e viram as versões dos fatos que os Marinho, Civita, Mesquita e Frias quizeram. É óbvio que não pretendem abrir mão deste monopólio e vão estrebuchar, acusar, distorcer, chamar de censura – tudo enfim – que puder evitar ou adiar ao máximo um processo que visa democratizar os meios de comunicação.
Eu entendo os motivos do PiG. E ele entende os meus. Por isso nunca nos entenderemos sem a Lei dos Médios brasileira.
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