A empresa de fachada mantinha conexões íntimas com a máfia internacional.
Mas para os felizes compradores dos carrões de luxo, alguns deles jogadores de futebol, músicos famosos e celebridades de revista, pouco importa operar comercialmente com grupos de criminosos. O que vale mesmo é receber vantagens tentadoras na compra de automóveis que custam centenas de milhares de reais. Ainda que estejam conscientes da prática de crime de sonegação fiscal.
Ano passado, a empresária Tânia Bulhões, do grupo Tânia Bulhões Home, importadores de artigos de decoração de luxo, foi condenada a quatro anos de prestação de serviços comunitários, acrescidos do pagamento de 1,2 milhões de reais por crimes de formação de quadrilha, descaminho, falsidade ideológica e crime contra o sistema financeiro nacional.
Anteriormente, a empresária Eliana Tranchesi, também havia sido presa pelos mesmos crimes. O caso provocou perplexidade por se tratar do templo do luxo paulistano. A Daslu havia construído um palacete num bairro “nobre” de São Paulo reunido num mesmo lugar as grifes mais badaladas e caras do mundo da moda.
Mês passado, os consumidores da grife Zara ficaram impressionados ao saber que na cadeia produtiva da calça jeans que custa mais de mil reais, bolivianos escravizados em oficinas clandestinas não recebiam mais de 0,25 centavos por costurar o vestuário de luxo.
No imaginário nacional a sonegação fiscal não é considerada um crime. Durante anos, as elites se acostumaram a serem beneficiárias do Estado e confundirem as coisas públicas e privadas.
As relações privadas antecedem a construção das instituições públicas no Brasil. Durante séculos, as elites se habituaram a receber favores do Estado e organizá-lo conforme seus interesses. Para a elite, o Estado sempre foi uma ferramenta de extensão de seus domínios e influência.
Dessa forma, a cobrança de tributos e a exigência de obrigações legais, causam incômodo e estranhamento por parte daqueles que não se vêem como cidadãos iguais aos demais no cumprimento de responsabilidades e na garantia de direitos.
O mercado de luxo se alimenta da desigualdade social. A aquisição de pertences que se caracterizam não somente pelo seu valor de uso, mas pela ostentação de uma grife, tem o intuito de distinguir o consumidor da ampla maioria. É uma espécie de crachá de diferenciação, capaz de abrir portas e deixar claro que o indivíduo que usa determinada marca pertence a uma casta superior da sociedade. Em troca, o cidadão ganharia garantias sociais extraordinárias, pois “cada um sabe seu lugar” na sociedade.
Confesso que conheço muito pouco (ou quase nada) sobre grifes e marcas.
No entanto, não me incomodo com as prioridades alheias. Pouco me importa se um indivíduo pague dez vezes mais caro por um produto que lhe parece interessante.
Mas considero uma cafajestagem dispor de pequenas fortunas para comprar futilidades e economizar na hora de pagar os impostos dos quais dependem toda a sociedade.
Obviamente, existe uma distorção na organização tributária brasileira. Muitos pequenos e médios empresários são esmagados por uma carga escorchante de impostos.
A classe pobre, proporcionalmente, paga muito mais impostos e sequer tem a chance de sonegar.
Existe uma concepção geral de que o Estado é corrupto e o mercado é honesto. Os políticos são maus e os indivíduos são bons (todos eles).
Obviamente, a lógica do Estado não estaria desconectada das outras esferas da vida social. Ao contrário, o Estado reproduz as regras de uma ordem estabelecida em que a vantagem privada antecede o fortalecimento da organização coletiva.
Como se vê, os vilões não são somente os políticos. Aliás, estes são meros reflexos de uma ordem social que se impôs de cima para baixo, a partir das elites, permeando toda a estrutura da vida nacional.
Como se vê, os vilões não são somente os políticos. Aliás, estes são meros reflexos de uma ordem social que se impôs de cima para baixo, a partir das elites, permeando toda a estrutura da vida nacional.
O Brasil só poderá se desenvolver de verdade com justiça social. E essa justiça depende do cumprimento das leis e da igualdade entre os indivíduos na aplicação do direito.
Aos que esbanjam dinheiro comprando artigos de luxo, sugiro que reservem um orçamento para o pagamento de tributos.
Não dá mais pé o sujeito comprar um automóvel de trezentos mil reais e licenciar o carro no Acre pra pagar menos IPVA e não receber as multas. Ou uma madame pagar vinte mil reais em um vestido e reclamar da carga tributária..
Lembro-me daquela propaganda do cartão de crédito. Calça Zara 1,5 mil, vestido da Daslu 20 mil, vaso importado pela Tânia Bulhões 35 mil, carro contrabandeado 350 mil. Recolhimento de impostos: não tem preço.
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