Por Mair Pena Neto
A situação da greve da Polícia Militar da Bahia é extremamente
complexa e não permite juízos definitivos. Por um lado, não se pode
aceitar que policiais ajam como bando armado, demonstrando seu poder de
fogo, nem que usem crianças como escudos humanos para se precaver contra
uma possível invasão da Assembleia Legislativa, onde se concentram. Por
outro, não se pode ignorar suas reivindicações, seus baixos soldos, e
cercá-los como sequestradores, negando qualquer tipo de diálogo ou
futura anistia, parte de qualquer negociação razoável.
Nós já vimos esse filme aqui no Rio de Janeiro. Bombeiros em greve
tomaram um quartel da corporação, atitude também equivocada, e o
governador os chamou de bandidos. Depois, com o nível de organização dos
grevistas e com o apoio popular que conquistaram, o governador não só
fez passar uma anistia na assembleia estadual, como também a Câmara
Federal a aprovou.
Movimentos reivindicatórios levam a extremismos, e cabe às partes
mais sensatas, especialmente os governantes, isolá-los em busca de uma
situação pacífica. Assim como Cabral, o governador da Bahia, Jaques
Wagner, não se mostrou muito hábil no espocar da crise e reagiu com o
radicalismo oposto ao dos grevistas. Enviou tropas do Exército para
cercar a assembleia legislativa e fez discurso duro contra os policiais,
responsabilizando-os até por algumas mortes que vinham ocorrendo em
Salvador.
Tanto o governo baiano quanto o federal mencionaram a existência de
um modus operandi no movimento dos policiais no país, que incluiria
atentados e até assassinatos para atemorizar a população. Nenhuma
cartilha ou prova foi apresentada, o que se serviu para aumentar a
tensão. Pelo lado dos policiais, um ex-soldado, que atua em Brasília
pela votação da proposta de emenda constitucional que criaria um piso
nacional para a classe, também ajudou a botar lenha na fogueira, dizendo
que policiais não são trabalhadores quaisquer, pois portam armas.
Criminalizar o movimento dos policiais não parece a estratégia
adequada. Surpreende até que governos mais à esquerda, como o da Bahia e
o federal, recorram a esse tipo de atitude, repetindo o padrão de
comportamento da direita, que vemos constantemente em São Paulo.
O que os policiais pretendem é um aumento salarial. É uma
reivindicação legítima de toda categoria, mesmo que a forma de ação
pareça errada. Nos grandes centros urbanos, quase todo mundo reconhece
que os policiais militares ganham pouco diante dos riscos da função que
exercem. Este senso comum talvez tenha sido o que originou maior apoio
popular à greve dos bombeiros no Rio.
A greve na Bahia, que sucede as já ocorridas no Rio, Ceará e
Maranhão, revelam que a insatisfação é nacional e exige bem mais que
soluções locais. O momento seria o de debater o papel das polícias e sua
desmilitarização, que cria a situação anormal de impedi-las de se
organizarem e de se manifestarem, justamente por serem militares.
Diferentemente dos bombeiros, policiais militares não são vistos com
simpatia pela população, porque sempre agiram contra ela dentro de uma
lógica militar. A reestruturação da polícia e a mudança de seu caráter
não só contribuiria para a resolução de questões de classe, como a que
vemos agora, como poderia aproximá-la da população, conquistando o
respeito que desfruta em outros países, onde a morte de um policial é,
muitas vezes, motivo de comoção nacional.
Nenhum comentário:
Postar um comentário