sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Greve vai muito além da Bahia


Por Mair Pena Neto

A situação da greve da Polícia Militar da Bahia é extremamente complexa e não permite juízos definitivos. Por um lado, não se pode aceitar que policiais ajam como bando armado, demonstrando seu poder de fogo, nem que usem crianças como escudos humanos para se precaver contra uma possível invasão da Assembleia Legislativa, onde se concentram. Por outro, não se pode ignorar suas reivindicações, seus baixos soldos, e cercá-los como sequestradores, negando qualquer tipo de diálogo ou futura anistia, parte de qualquer negociação razoável.

Nós já vimos esse filme aqui no Rio de Janeiro. Bombeiros em greve tomaram um quartel da corporação, atitude também equivocada, e o governador os chamou de bandidos. Depois, com o nível de organização dos grevistas e com o apoio popular que conquistaram, o governador não só fez passar uma anistia na assembleia estadual, como também a Câmara Federal a aprovou.

Movimentos reivindicatórios levam a extremismos, e cabe às partes mais sensatas, especialmente os governantes, isolá-los em busca de uma situação pacífica. Assim como Cabral, o governador da Bahia, Jaques Wagner, não se mostrou muito hábil no espocar da crise e reagiu com o radicalismo oposto ao dos grevistas. Enviou tropas do Exército para cercar a assembleia legislativa e fez discurso duro contra os policiais, responsabilizando-os até por algumas mortes que vinham ocorrendo em Salvador.

Tanto o governo baiano quanto o federal mencionaram a existência de um modus operandi no movimento dos policiais no país, que incluiria atentados e até assassinatos para atemorizar a população. Nenhuma cartilha ou prova foi apresentada, o que se serviu para aumentar a tensão. Pelo lado dos policiais, um ex-soldado, que atua em Brasília pela votação da proposta de emenda constitucional que criaria um piso nacional para a classe, também ajudou a botar lenha na fogueira, dizendo que policiais não são trabalhadores quaisquer, pois portam armas.

Criminalizar o movimento dos policiais não parece a estratégia adequada. Surpreende até que governos mais à esquerda, como o da Bahia e o federal, recorram a esse tipo de atitude, repetindo o padrão de comportamento da direita, que vemos constantemente em São Paulo.

O que os policiais pretendem é um aumento salarial. É uma reivindicação legítima de toda categoria, mesmo que a forma de ação pareça errada. Nos grandes centros urbanos, quase todo mundo reconhece que os policiais militares ganham pouco diante dos riscos da função que exercem. Este senso comum talvez tenha sido o que originou maior apoio popular à greve dos bombeiros no Rio.

A greve na Bahia, que sucede as já ocorridas no Rio, Ceará e Maranhão, revelam que a insatisfação é nacional e exige bem mais que soluções locais. O momento seria o de debater o papel das polícias e sua desmilitarização, que cria a situação anormal de impedi-las de se organizarem e de se manifestarem, justamente por serem militares.

Diferentemente dos bombeiros, policiais militares não são vistos com simpatia pela população, porque sempre agiram contra ela dentro de uma lógica militar. A reestruturação da polícia e a mudança de seu caráter não só contribuiria para a resolução de questões de classe, como a que vemos agora, como poderia aproximá-la da população, conquistando o respeito que desfruta em outros países, onde a morte de um policial é, muitas vezes, motivo de comoção nacional.

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