Líder do movimento golpista que pretende apear a presidenta Dilma Rousseff do Palácio do Planalto, o vice-presidente Michel Temer foi citado em uma planilha encontrada pela Polícia Federal (PF) na casa de Pietro Francesco Giavina Bianchi, diretor da construtora Camargo Corrêa, ao lado de valores que totalizam R$ 410 mil. O fato, ocorrido em São Paulo, há sete anos, poderá ser retomado nas investigações realizadas no âmbito da Operação Lava Jato, da PF.
A planilha, de 54 folhas, foi a público em dezembro
de 2009. O documento, apreendido pela equipe da delegada Karina Murakami
Souza na manhã do dia 25 de março daquele ano, agora está anexado aos
autos da Operação Castelo de Areia, que investigava a
empreiteira pelos crimes de evasão de divisas e lavagem de dinheiro,
além de um suposto esquema de caixa dois para financiar partidos
políticos. O processo, embora complete sete anos e tenha sido arquivado,
ainda segue inconcluso.
Temer, à época, reagiu à
denúncia: “Trata-se de uma infâmia das mais degradantes, colocarem meu
nome em um papel apócrifo que passa a ser tratado como documento. Nunca
tive nenhum pedido da Camargo Corrêa para intervir em alguma obra, não
conheço quase ninguém da Camargo Corrêa e não recebi absolutamente nada a
não ser uma contribuição oficial na última campanha de R$ 50 mil, que
foi declarada à Justiça Eleitoral”, afirmou.
Levantamento
feito junto ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo e publicado em
sites de notícias, mostra que o deputado Michel Temer não declarou
doações da Camargo Corrêa, em 1998. As planilhas apreendidas mostram que
o total de valores destinados a partidos e a políticos alcançam a soma
de R$ 178 milhões em supostas doações registradas pelo diretor da
empreiteira entre os anos de 1995 e 1998.
De volta à lista
Realizada pela Polícia Federal e Ministério Público de São Paulo, a Castelo de Areia
desarticulou o esquema de desvios em obras e pagamentos de propina a
agentes públicos capitaneado pela construtora Camargo Corrêa. Em 2010,
após emblemática atuação do criminalista Márcio Thomaz Bastos, já
falecido, a operação foi interrompida por uma liminar do ministro Cesar
Asfor Rocha para, em 2011, ser arquivada após decisão plenária do
Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em seguida, a Procuradoria-Geral da
República (PGR) recorreu ao Supremo, onde o relator é o ministro Luís
Roberto Barroso.
O assunto, porém, ainda não foi
definitivamente enterrado. A discussão no STF, da qual o ministro
Barroso agora volta a cogitar sua retomada, resulta de uma apelação da
PGR que tenta reverter o entendimento do STJ de que as interceptações
telefônicas utilizadas na investigação foram requisitadas apenas com
base em denúncia anônima. Assim, a planilha poderá voltar, no bojo da Operação Lava Jato, durante análise de outras planilhas reveladoras, recém-apreendidas nos escritórios da empreiteira Odebrecht.
Além
de Temer, aparecem na planilha os nomes de mais de 200 políticos e
autoridades. Por envolver pessoas com direito ao chamado foro
privilegiado, o Ministério Público Federal de São Paulo, que coordenava a
investigação, encaminhou todos os documentos à Procuradoria Geral, em
Brasília. Na época, a procuradora Karen Kahn, do Ministério Público
Federal em São Paulo, apresentou denúncia contra três diretores da
empreiteira. Além de Bianchi, foram denunciados Darcio Brunato e
Fernando Dias Gomes. Eles deverão responder pelos crimes de lavagem de
dinheiro e evasão de divisas. Estão todos soltos.
O
MPF pediu a abertura de inquéritos para apurar os crimes de corrupção
ativa e passiva, supostamente precedentes aos de evasão e lavagem. Em
outro pedido à Justiça, a procuradora solicitou a apuração de possível
formação de cartel, consórcios extra-oficiais e superfaturamento. Os
trabalhos iniciais apontam desvio de verbas de três obras públicas
feitas pela Camargo Corrêa. O dinheiro desviado também teria sido
destinado a partidos políticos.
“Michel Temer”
O
nome do presidente da Câmara, grafado incorretamente como “Michel
Temer”, aparece em uma das 54 folhas da planilha apreendida na casa de
Bianchi. Impressa em papel A-4, a planilha traz nomes de políticos,
partidos ou órgãos governamentais seguidos de 11 colunas na horizontal
com valores e informações detalhadas. O documento não tem assinatura,
timbre nem identificação da empreiteira e, no caso de Temer, não há
indícios que esclareçam se o dinheiro foi ou não entregue ao deputado.
Na documentação, o presidente da Câmara não está associado a nenhuma
obra e, por enquanto, não há em torno dele qualquer investigação formal.
Ao
lado do nome de Temer foram registradas 22 cifras com valores em
dólares, datas, taxas de câmbio e devidas conversões para o real. As
cifras são redondas (geralmente US$ 10 mil ou US$ 5 mil) e em alguns
anos têm periodicidade mensal. A legislação brasileira proíbe doações em
moeda estrangeira. Temer teve um primeiro mandato de presidente da
Câmara entre 1997 e 1998, e um segundo entre 2001 e 2002. Em ambos os
casos, garantiu o apoio de parte do PMDB (partido que preside há mais de
uma década) ao então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Depois, foi aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Atualmente,
ocupa a Vice-presidência ao lado de Dilma Rousseff (PT) e agora tenta
chegar, pela via indireta, à Presidência da República.
De
acordo com o documento apreendido pela PF, os valores começam em 9 de
outubro de 1996 (US$ 30 mil, taxa de 1,043%, R$ 31.290). No dia 12 de
novembro surge o valor de US$ 10 mil (a 1,075%, R$ 10.750) com a
observação “penúltima”. E em 23 de dezembro outros US$ 10 mil (R$ 11.115
à época), com a observação “última” e o total do ano em reais: R$
53.190. A soma final alcança R$ 410.765,00 do início de outubro de 1996
até o dia 28 de dezembro de 1998.
Em 1998, Temer
foi o quarto deputado mais votado de São Paulo com 206.154 votos.
Naquela eleição ele declarou exatos R$ 500.000,01 em doações, nenhuma
delas da Camargo Corrêa. A empreiteira apareceria na relação de seus
financiadores em 2006, com R$ 50 mil. Segundo sua prestação de contas ao
TRE, a campanha de deputado, então, custou R$ 705.577,04.
Uma
das principais dificuldades dos investigadores para identificar e
enquadrar os supostos beneficiários das doações da Camargo Corrêa é o
fato de que, segundo acusação da polícia, a empresa se utilizava do
doleiro Kurt Pickel para remeter o dinheiro ao exterior por meio de empresas offshore (nas quais não aparece o nome do proprietário).
A
Camargo Corrêa confessou a existência do documento. A empresa afirmou,
no entanto, que não teve acesso às planilhas apreendidas na casa do
diretor Bianchi e ressalta que o arquivo é apócrifo.
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