A sanção da lei ainda depende da aprovação, na próxima semana, na Câmara de Deputados
Meio passo foi dado na madrugada desta quinta-feira (26/04) para a
expropriação de 51% das ações da empresa petrolífera YPF com a
aprovação, pelo Senado argentino, do projeto de lei apresentado pelo
governo de Cristina Kirchner. Dos 70 senadores presentes, 63 votaram a
favor, três votaram contra e quatro se abstiveram.
A sanção da lei ainda depende da aprovação, na próxima semana, na
Câmara de Deputados, onde governistas e aliados contam com maioria. O
projeto legislativo foi discutido por cerca de 15 horas no Senado e
obteve apoio de opositores, como o partido UCR (União Cívica Radical) e a
coalizão socialista FAP (Frente Ampla Progressista).
Caso a lei apresentada há 10 dias pelo governo for aprovada pelos
deputados, a empresa espanhola Repsol, que possui 57,4% de participação
acionária na petrolífera, manterá apenas 6,4% de suas ações.
Uma das figuras mais esperadas durante a jornada de debate era o
senador Carlos Menem, presidente entre 1989 e 1999, época em que ocorreu
a privatização da companhia. Menem, no entanto, não apareceu. Na última
sexta-feira (20), o peronista afirmou que votaria a favor da iniciativa
governista de nacionalizar a empresa.
“Seria bom escutar que os que privatizaram a YPF hoje peçam perdão”,
insinuou o senador Gerardo Morales, da UCR, partido que se opôs à venda
da YPF na década de 1990 e mostrou coerência discursiva durante o debate
legislativo. A legenda manteve uma postura dura em relação à política
energética e administração dos recursos naturais do país nos últimos dez
anos, durante os governos de Néstor e Cristina Kirchner.
Membros da UCR – fundada pelo ex-presidente Hipólito Yrigoyen
(1916-1922 e 1928-1930), responsável pela criação da empresa petrolífera
estatal em 1922 - pediram ainda que a AGN (Auditoria Geral da Nação)
controle, regule preços e condições de produção da YPF, além de propor a
criação de uma Agência Hidrocarbonífera para administrar a atividade do
setor.
Para o chefe do bloco do radicalismo no Senado, Luis Naidenoff, a
decisão de aprovar a nacionalização da petrolífera se deve à história
“de mais de 100 anos de vida” da UCR. “Há uma história que nos respalda
e, por isso, ninguém pode se surpreender com o que partido vota”,
afirmou. “A opinião pública se surpreende com o fato de que apoiemos um
projeto do [poder] Executivo, mas se continuamos com este nível de
enfrentamento, não saímos do lugar”, explicou.
Os senadores do FAP, por sua vez, aprovaram o texto geral do projeto
governista, mas apresentaram objeções a alguns artigos do texto de lei.
“O socialismo se opôs à privatização da empresa em 1992. Rejeitou uma
medida que seria muito negativa para o país, como demonstraram estes 20
anos, que foi uma política de saqueio”, explicou o senador Rubén
Giutiniani.
Questionamentos
Dois aspectos do texto de lei, no entanto, foram alvos de
questionamento pelo bloco socialista. O primeiro deles se refere à
distribuição acionária da YPF entre as províncias do país. Para
Giustiniani, as localidades não produtoras de hidrocarbonetos também
devem ser beneficiadas pela medida. “Uma empresa como a YPF não é só um
poço de petróleo. A YPF tem postos e refinarias em todo o país”, alegou.
O segundo ponto se refere ao artigo de lei que não prevê o controle da
gestão da petrolífera pela Controladoria do país. “Na história das
empresas do Estado, se diz que foram privatizadas por ineficiência e por
corrupção. Queremos que a Auditoria Geral da Nação tenha autoridade
para controlar os funcionários e o dinheiro público que vai para a
empresa”, afirmou.
Entre os senadores que se abstiveram da votação está a ex-candidata à
prefeitura da capital argentina, María Eugenia Estenssoro, da CC
(Coalizão Cívica), que afirmou encontrar-se em um dilema: “A razão me
diz que eu deveria votar contra porque isso é uma enganação para todos
os argentinos”, disse, complementando, porém, que seu “coração indica
que os hidrocarbonetos são estratégicos”, mas que não acredita na
transparência do Estado que os controlará.
O bloco kirchnerista, por sua vez, defendeu-se reiteradamente das
acusações do apoio a Menem na época das privatizações e elogiou a
iniciativa governamental. O ex-menemista e atual líder do bloco
kirchnerista no Senado, Miguel Ángel Pichetto, afirmou que a
privatização da empresa foi um dos maiores erros da década de 1990.
“Se não se tem Estado Nacional, não se tem nada”, afirmou o senador,
mostrando um giro de 180º em relação à postura mantida no período das
privatizações. “Esta é uma decisão de alta voltagem tomada pela
presidente e temos que valorizá-la”, disse, ressaltando: “Que as
empresas tomem nota, porque todas elas vão ter que ir se ajustando aos
padrões de auto-abastecimento e investimentos”.
Os únicos senadores que votaram contra o projeto de lei - que declara a
YPF como um “interesse público nacional” com o objetivo prioritário de
garantir o auto-abastecimento de hidrocarbonetos em sua exploração,
industrialização, transporte e comercialização – foram os peronistas
“dissidentes” do Partido Justicialista, Liliana Negre de Alonso, Juan
Carlos Romero e Adolfo Rodríguez Saá, ex-presidente argentino que ficou
no posto durante sete dias, na crise de 2001.
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