Um polêmico poema afirmando que Israel põe em risco a paz mundial rendeu ao escritor alemão duras críticas. Na sequência, o autor defendeu-se em entrevistas concedidas à mídia alemã, dizendo sentir-se ridicularizado.
O escritor e Prêmio Nobel de Literatura Günter Grass ganhou destaque nas
mídias alemã e internacional desde a publicação de seu poema Was gesagt
werden muss (O que precisa ser dito, em tradução livre) na última
quarta-feira. Em diversas entrevistas concedidas nesta quinta-feira
(05/04), Grass defendeu-se das acusações de retrógrado e antissemita.
No poema de 388 palavras, o autor afirma que a potência nuclear Israel
ameaça a frágil paz mundial. Após duras críticas depois da publicação,
Grass disse sentir-se ofendido e ridicularizado pela imprensa alemã. O
escritor de 84 anos de idade declarou à emissora alemã NDR ter previsto
que seria rotulado como antissemita. "Trata-se de velhos clichês.
Falou-se imediatamente, como era de se esperar, no termo
antissemitismo."
Em toda a sua obra literária, o escritor discute o passado alemão,
defendeu-se Grass em entrevista ao canal de televisão 3sat. "Em meus
livros Die Blechtrommel [O tambor, na tradução brasileira] (1959) e Beim
Häuten der Zwiebel [Nas peles da cebola] (2006) está presente o peso da
minha geração, a discussão sobre os crimes de responsabilidade dos
alemães. E, por isso, essa acusação de antissemitismo é de um ódio
atentatório sem igual", declarou.
Olhar crítico
Grass admite ter errado ao falar em seu poema de Israel como um todo e
não do governo israelense concretamente. Ele enfatiza sua simpatia pelo
país, mas expressa preocupação sobre seu desenvolvimento. Um ataque
preventivo contra o Irã poderia provocar um acidente nuclear ou até
mesmo uma Terceira Guerra Mundial.
"Essa não é simplesmente uma pequena ação militar. Não é como se alguns
mísseis fossem disparados e houvesse apenas algumas mortes, como
afirmaram o senhor Barak [presidente dos EUA] e Netanyahu
[primeiro-ministro israelense]. Trata-se de uma ação militar que terá
consequências. A situação está se agravando. O perigo de operações de
guerra em seguida é cada vez maior", considerou Grass.
O escritor também se mantém firme na crítica ao governo alemão, que,
segundo Grass, coloca em prática "uma reparação hipócrita" ao fornecer e
financiar uma parte dos custos de submarinos a Israel. Três dessas
embarcações já estão operando e duas outras deverão ser entregues até o
fim de 2012. Em março deste ano, acordou-se sobre o fornecimento de um
sexto submarino, que terá um terço de seus custos bancado pela Alemanha.
Grass admite ter errado ao falar em seu poema de Israel como um todo e não do governo israelense concretamente |
Grass admite ter errado ao falar em seu poema de Israel como um todo e não do governo israelense concretamente
Esses submarinos podem ser equipados com torpedos convencionais e também
com ogivas nucleares. "Assim, nos tornamos corresponsáveis", afirma
Grass. O escritor alerta também sobre o crescente isolamento da Alemanha
em termos diplomáticos.
"Após as experiências da Segunda Guerra Mundial, temos nos esforçado até
agora para tentar manter diálogos e negociações. Tais tentativas também
estão em curso com o governo de Israel. Essa autocracia, decidir por si
mesmo não importa o que os outros digam, é uma ruptura com a tática até
então bem sucedida: enquanto se dialoga, não se dispara", diz.
Grass vê como uma obrigação lançar um olhar crítico sobre Israel. Para o
autor, não se pode poupar o país. Isso seria "covardia diante dos
amigos", citando as palavras do ex-chanceler federal alemão dos tempos
da Guerra Fria, Willy Brandt.
Defesa israelense
Em Israel, não houve grande alvoroço sobre o poema de Grass, relata o
jornalista e historiador Tom Segev, de Jerusalém. Pessoalmente, ele
considera a obra "terrivelmente vã" e "embaraçosa". A comparação ente
Israel e Irã distorce os fatos, diz. "É fato que o Irã ameaça destruir
Israel, mas Israel nunca teve a intenção de destruir país algum."
Para Segev, Grass não é, porém, nem antissemita nem anti-israelense. "É
legítimo criticar Israel, também na Alemanha. Às vezes é até mesmo
necessário. Com relação à opressão dos palestinos, a crítica de fora é
muito importante. Direitos humanos em um país só podem ser realmente
defendidos de fora", opina o jornalista.
Há poucos meses, Segev fez uma visita a Grass. Ele gostaria que o Prêmio
Nobel fizesse melhor uso "das últimas gotas de sua tinta" – como
escreveu o poeta em um dos versos de seu polêmico poema –, escrevendo um
belo romance.
Autora: Claudia Hennen (lpf)
Revisão: Carlos Albuquerque
No DW, via Com Texto Livre
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